Uma Pequena História da Música [60]
Zarzuela
Barbieri e Arrieta
- Partilhar 1/10/2024
O século XIX assistiu ao triunfo definitivo da zarzuela em Espanha. Nessa altura, conseguiu adquirir uma linguagem própria, longe das influências da ópera italiana, alemã e francesa, e alcançou uma unidade estrutural e temática que acabaria por lhe conferir um lugar importante no panorama musical espanhol.
Este género,
marcadamente espanhol, deve o seu nome ao
local onde se realizaram as primeiras
representações, o Real Sitio de la Zarzuela,
perto de Madrid. Parece que os primeiros
autores a criar obras para este novo estilo
de teatro musical foram Lope de Vega e
Calderón de la Barca.
Segundo alguns
investigadores, Calderón é o primeiro
dramaturgo a adotar o termo “zarzuela” para
uma peça sua intitulada El golfo de las
sirenas, estreada em 1657 e que
interpretava a vida de um jovem aventureiro
que embarcava numa longa viagem cheia de
mistérios e perigos. A zarzuela foi também
cultivada em Cuba, onde nasceram os
compositores Gonzalo Roig e Ernesto Le mona,
e na Venezuela, com José Ángel Montero.
ARTE LÍRICA E CÉNICA
A zarzuela, como género lírico e
cénico que é, inclui partes cantadas, sejam
solos ou coros, partes instrumentais e
partes faladas. Abundam as cenas cómicas ou
amorosas, geralmente interpretadas por um
duo, e os temas são normalmente de carácter
folclórico, popular e local. Embora, talvez,
para compreender o carácter deste género,
seja melhor tomar emprestadas as palavras do
compositor e crítico musical Manuel Valls
Gorina: “A zarzuela tem um carácter de
entretenimento, um tema alegre em que se
expõem situações do momento (políticas,
sociais, mexericos palacianos, notícias do
bairro, etc.) e que, como espelho da
sociedade, reflete as suas progressivas
mutações”.
Durante o século XIX, esta
estrutura formal da zarzuela manifesta-se
sob duas formas: o género grande e o género
pequeno. Em geral, a zarzuela “grande” tem
dois ou três actos e inclui frequentemente
fragmentos musicais que têm alguma
semelhança com o género operático italiano.
O género pequeno, por outro lado, agrupava
as zarzuelas que se desenrolavam num só ato.
O TEATRO DE ZARZUELA
Dado o êxito que
a zarzuela começou a ter em meados do século
XIX, a Sociedad Lírica Española, com o apoio
de alguns dos principais compositores da
época, como Barbieri e Gaztambide, e com o
financiamento do banqueiro Francisco de las
Rivas, iniciou a construção de um teatro em
Madrid para acolher exclusivamente
espectáculos de zarzuela.
O projeto do
Teatro de la Zarzuela foi confiado ao
arquiteto Jerónimo de Gándara, embora tenha
sido executado por José María Guallart. O
edifício final, inspirado no La Scala de
Milão, tinha uma forma de ferradura e três
níveis de camarotes. A sua inauguração teve
lugar numa data muito especial, 10 de
outubro de 1856, aniversário da rainha
Isabel II de Espanha «a Rainha Castiça»,
grande amante do género zarzuela.
FRANCISCO ASENJO BARBIERI (1823-1894)
Foi, sem dúvida, um dos compositores que
mais contribuiu para a consolidação do
género zarzuela, considerando que as suas
obras foram as iniciadoras da sua
consolidação e as que dariam o tom às
composições posteriores.
Ao longo da sua
carreira compôs cerca de setenta zarzuelas,
entre as quais se destacam Jugar con
fuego (1851), Los diamantes de la
corona (1854), Pan y toros
(1864) e El barberillo de Lavapiés
(1874). Todas elas são peças cheias de humor
e frescura, nas quais as influências
italianas estão ainda muito presentes,
exceto em El barberillo, que já
prefigura uma linguagem musical propriamente
espanhola.
EMILIO ARRIETA (1821-1894)
Outro dos principais compositores desta
primeira geração de autores que ajudaram a
dar forma ao género zarzuela foi Emilio
Arrieta, embora os seus inícios estivessem
ligados a outro género, a ópera, na qual
também teve grande êxito. Por exemplo, a sua
primeira ópera, Ildegonda (1846),
ganhou o primeiro prémio de composição no La
Scala de Milão. Seguiram-se La conquista
de Granada (1850) e Pergolesi
(1851), já estreada em Madrid.
Por esta
altura, a zarzuela começa a dominar a cena
musical espanhola graças aos êxitos de
Barbieri e outros compositores, e Arrieta
abandona a ópera para se dedicar a este novo
género, no qual compõe mais de cinquenta
obras. A primeira delas foi El dominó
azul (1853) e a última San
Francisco de Sena (1883), mas sem
dúvida a mais famosa, e ainda comum nos
repertórios de zarzuela actuais, foi
Marina (1855), que mais tarde, em 1871,
o próprio compositor adaptou como ópera em
três actos.
Adaptado por Francisco Gil,
A partir de um texto de J.L.Iriarte
Emilio Arrieta: Marina (1871)
Libreto: Francisco Camprodón
Uma Pequena História da Música
- Ano VI • 64 • outubro 2024