Animals 'Я' Us
Rute Rocha
Imunidade e vacinas
- Partilhar 02/07/2021
Acho impressionante o número de pessoas que (me) falam convictamente sobre imunidade! Gostaria de ter oportunidade de lhes perguntar se me sabem explicar sucintamente a diferença entre linfócitos-B e linfócitos-T. Só a título de exemplo!
E o que é efetivamente a imunidade, a que se referem? À inata?
Na biologia, a imunidade é a capacidade, inata e adquirida, que os organismos têm em gerar defesas biológicas para combater agentes, substâncias ou células, cujo organismo os reconhece/assume como corpos estranhos (sendo que às vezes, são algumas das suas próprias células!).
Contudo, este mecanismo biológico apresenta um limite a partir do qual, o organismo não consegue gerar defesa, nem se manter em homeostasia. Nesse momento, diz-se que o organismo está “doente”.
É neste momento, que reside o meu ponto de reflexão...
Se analisarmos do ponto de vista evolutivo, nós, como organismos inseridos numa pequena comunidade, na grande maioria das vezes, teríamos uma resposta imunitária adequada e suficiente para que o nosso organismo mobilizasse as defesas necessárias para eliminar um agente “patogénico”. Sim, evidencio, numa pequena comunidade (efeito de ilha).
Contudo, na atualidade, nós não vivemos numa ilha biológica! (Con)vivemos uns com os outros, em extrema proximidade, com entradas e saídas constantes de microrganismos (bactérias, protozoários, fungos) e vírus.
Nos nossos organismos prevalece uma «promiscuidade» biológica e com transporte e partilha de milhares deles, trazidos de diversos cenários biológicos. Movimentamo-nos muito, transportamos nos aviões uma bagagem biológica «mais pesada» que a bagagem de porão. Reparem a rapidez com que nos movemos para a India, o México, os Estados Unidos da América... Alguns de nós fazemos coleção de viagens, de microrganismos e vírus, disseminamo-los, partilhamos, intercambiamo-los (sem taxas alfandegárias) pelos nossos familiares e amigos.
Como querem que cada um de nós, com uma resposta imunológica preparada para responder q.b. (como uma pitada de sal), ser posta à prova perante tantos e tantos milhares de agentes externos? Não sejamos naïfs!
Tenho-vos a dizer, que não chegamos aos 50, 60, 70 anos de idade, sem recorrer a uma ajudinha científica, preciosa, «Pasteuriana» (Louis Pasteur), que são as vacinas!
O meu filho tem um cartão de vacinas recheado de carimbos. Porque será?
Por favor, verifiquem os Vossos cartões de vacinas... apertem os cintos, que o avião vai levantar voo...
Recordo-me que para trabalhar na função pública, tive de apresentar o cartão de vacinas, fazendo prova da vacina BCG. Aposto que nunca a questionou! Questionou-se sobre alguma das outras? Como podemos induzir uma imunidade ativa de grupo sem vacinação?! Sejamos responsáveis e informados. Precisamos de mais literacia científica, para que as decisões sejam diversas, mas fundamentadas.
Mudanças e adaptação biológica!
- Partilhar 17/04/2021
Sinto que estamos a
viver um momento histórico da humanidade!
Para mim tem sido tranquilizador, pensar
desta forma. Vivo a mudança, com menos gasto
energético. Sim, porque as mudanças são
pouco fáceis e até muito difíceis para
alguns! São momentos que nos consomem muita
energia, porque a mudança nos quebra as
rotinas pessoais, sociais e sobretudo as
rotinas cerebrais.
A mudança aumenta a
estimulação neuronal dos nossos corpos com
um gasto energético associado muito elevado.
Mas mais elevado do que o gasto energético
associado à mudança, é o gasto energético
associado à resistência que os seres vivos
fazem a essa mesma mudança.
A ideia
genérica de Charles Darwin de que não é o
mais forte que sobrevive, mas sim o que
melhor se adapta à mudança, nunca fez tanto
sentido como nos dias de hoje.
Mas
cuidado!
Não nos adaptemos ao “mau”!
A
meu ver, os humanos, como animais que somos,
apresentamos uma elevada capacidade de
adaptação biológica, por vezes,
inimaginável!
Recordemos a história,
aquando do holocausto, em que 6 milhões de
humanos se tentaram adaptar a tanta
crueldade e monstruosidade, na tentativa de
sobreviver.
Para este número tão elevado,
foram muitas, as “Donas Begónias”
que contribuíram
para tamanha crueldade, aquando das
denúncias sobre os seus vizinhos e
familiares, instigando mais medo e mais
gasto energético.
Um ser vivo não
sobreviveria, se diariamente estivesse a
gastar energia, como a que gasta quando lida
com uma mudança.
Mas atenção! Não
ponhamos em causa os valores éticos, como
por exemplo, a democracia,
adaptando-nos/submetendo-nos “cegamente” a
tomadas de decisão, que algumas vezes são
infundadas ou são resultado do efeito de
“rebanho” (irrefletidas).
Dupla atenção,
para o medo gerado e muitas vezes reforçado
em contextos de mudança. O que tenho
observado é que mesmo, algumas mentes mais
criativas se têm resignado... e a meu ver,
perdendo a lucidez e a energia para que
ocorra a tão necessária mudança.
É um
facto, as mudanças são rápidas, com
exigentes adaptações e com gastos
energéticos elevados. Por isso, quando
ocorrem reais mudanças, estas não podem ser
muitas, nem por períodos longos.
Neste
ponto, identifico-me com a teoria de
evolução dos equilíbrios pontuados de Niles
Eldredge e Stephen Jay Gould, no qual
admitimos que as populações passam por
longos períodos, evoluindo de modo lento,
sem alterações significativas nas
características que exibem, seguidos por
pequenos e rápidos períodos de grandes
mudanças.
Agora, neste preciso momento,
que estamos a vivenciar uma pandemia à
escala planetária, estaremos nós a assistir
a um período de grandes mudanças? De mudança
na nossa organização social? A preparar-nos
para viver em comunidades mais pequenas? A
assistir ao início de uma revolução
energética? A gerar “empregos” de outra
natureza? A assumir-nos como humanos e que
efetivamente fazemos parte da natureza?
Sinto que sim, repare no que atualmente se
tem exigido aos humanos: um gasto energético
elevado, uma rápida adaptação, emergência
dos medos e uma grande resistência à
mudança. Já reparou que o medo e a
resistência emergem em períodos de mudanças?
Está consciente desta/s mudança/s? Ou
ainda ;) considera que voltaremos ao que
éramos?
Açaime!
Todas as vezes que
saio à rua, sinto receio de nós mesmos.
Devemos ser muito perigosos, porque andamos
todos de açaime. Sim, leu bem, de açaime,
uma peça que se coloca nos cães ou outros
animais para não morderem.
Do senso comum emerge
a ideia de que existimos nós os humanos e a
natureza e, por consequência, a
superioridade humana sobre a natureza e
temos que nos proteger.
Desenganem-se, nós
humanos, somos natureza! É neste sentido,
que proponho uma responsabilização humana.
Os animais não são
mais importantes que as plantas, os humanos
não são melhores que os animais não humanos.
Apenas e só, temos esta sensação de
superioridade sobre tudo e todos, porque
somos muitos, demasiados!
O vírus... o vírus
apenas e só se propagou, propaga e se
propagará muito, porque a população humana é
excessiva e ocupa quase/todo o espaço do
planeta.
Vivemos em grandes
aglomerados, movimentamo-nos muito rápido de
um local para o outro, adquirindo um
estatuto quase de “omnipresente”! Estamos em
todo o lado, invadimos tudo, colonizamos
tudo e consequentemente, o vírus também
estará em todo o lado. Alexandre Quintanilha
afirma: “as bactérias, fungos e vírus que
estão no nosso corpo perfazem quase 40% das
células e mais de 90% da informação genética
que transportamos.”
E mais, os vírus não
querem matar-nos, eles querem os humanos
vivos para nele se replicarem e se manterem.
Quando as células humanas morrem, os vírus
também “sucumbem”.
Mas o busílis está em
que somos 7,8 mil milhões de humanos,
desgastando o meio envolvente. Com pequenas
ou grandes decisões, com pouco ou muito
impacto sobre o meio envolvente, todos somos
responsáveis, todos somos perigosos!
Atribuem a culpa
desta pandemia aos chineses ou aos vírus.
Considero uma falácia dupla! Por um lado
sinto a culpa como um conceito religioso e
se queremos refletir seriamente sobre esta
pandemia, devemos procurar responsabilidades
(e não culpas)! Por outro lado, não
procuremos responsabilidade em algo externo
a nós mesmos, humanos. Porque procurar
responsabilidades no outro, é uma tentativa
de nos desresponsabilizarmos!
E enquanto nos
desresponsabilizarmos, continuaremos com
os problemas e inevitavelmente com
sucessivas pandemias.
Definitivamente,
somos perigosos, precisamos usar açaime!
Trincheiras...
Milhões de soldados
entrincheirados, sujeitos ao medo da chegada
de um vírus, que nem estatuto científico de
“ser vivo” tem!
Genericamente, um
vírus é revestido por um invólucro proteico
e no seu interior contém material genético
sob a forma de RNA (ácido ribonucleico), em
cadeia simples e/ou DNA (ácido
desoxirribonucleico), em cadeia dupla,
enrolada em hélice, tão bem descrito por
Watson e Crick.
O COVID-19 apresenta
apenas RNA como material genético e com este
se replica e tão ferozmente se propaga.
Reparem no caricato
da situação.
O mesmo RNA que pela
simplicidade da molécula, há milhares de
anos no azul do nosso planeta impulsionou a
vida na Terra, põe agora a descoberto a
fragilidade humana e mostra-nos
convictamente que o ser humano não é mais o
melhor e o superior dos seres vivos!
Tanto armamento,
tecnologia, ciência, consciência,
criatividade, linguagem, comunicação,
economia... e nada nos serve, enquanto não
assumirmos compreender as causas desta
guerra biológica.
Talvez estejamos a
assistir/participar na terceira guerra
mundial, entrincheirados em casa,
pseudo-protegidos a pensar que
ultrapassaremos esta guerra em algumas
semanas... Uns escondidos, outros – mais
afoitos, a enfrentar “entidades” que
evoluíram durante milhares de anos!
Não se iludam
soldados! Não sairemos deste caos em algumas
semanas. E “todos bem”, não será certamente!
Bem sei que a
humanidade (ou a falta dela) não muda o seu
registo em tão pouco tempo. Mas, se
quisermos sobreviver, teremos de aceitar que
a nossa espécie destruiu a capacidade
inerente ao planeta Terra de manter a sua
homeostasia – a propriedade que lhe permite
regular o seu equilíbrio dinâmico e que lhe
“permite viver e alcançar também o seu
bem-estar”.
Será que este vírus
estará ao serviço do planeta?! Estará a
tentar sobreviver, com a mesma vontade que
tem cada um de nós, na trincheira ou no
campo de batalha?
Humanos! Vamos de uma
vez por todas repensar a natalidade, diminuir
a população humana e relevar a
biodiversidade do planeta. Não quero com
isto dizer,
aceitar esta "mortandade", negar a
manutenção da espécie, mas não sejamos
ingénuos ou nos vitimizemos. Há já muito que
excedemos o limite razoável para uma
população biológica (número de indivíduos de
uma mesma espécie que vive numa determinada
área, num espaço de tempo).
Reinventemo-nos como
uma biocenose ou real comunidade, mais em
equilíbrio com a natureza, assumindo-a como
intrínseca e não como exterior ao ser
humano.
E neste preciso
momento, com muito respeito, aceitemos que o
planeta Terra também está a tentar
(sobre)viver...
Animais de (sub)estimação?!
Senta! Senta! Good
boy! Lindo! Dá a patinha. Dá à dona, dá.
Busca a bolinha. O meu cão! A minha
Hachi(co)! A Hachi é considerada um animal
de estimação, como tantos outros!
São animais que
amamos. Mas que estranha forma de amar!
A meu ver, são
animais que estão em permanente cativeiro.
Mas, estão estes animais a recuperar de
alguma patologia ou ferimento? Sujeitos a
uma tentativa humana de os reproduzirem por
se tratar de uma espécie em vias de extinção
ou com alto grau de vulnerabilidade? É uma
estratégia de conservação da subespécie
(raça) ou manutenção do pedigree?
Parece-me mais uma
vez, uma relação de posse dos humanos face
aos não humanos!
Repara-se que só
damos nomes às aos cães e aos gatos e alguns
passeriformes que estão engaiolados!
Desde que os humanos
se agregaram em centros urbanos, a grande
maioria dos cães vivem em solidão nas casas
dos «donos», ansiosos por uma única saída.
Não sei porquê, mas este facto, recorda-me a
escravatura!
Os gatos, ficam em
casa dos donos, desde que nascem até que
morrem, como que sentenciados com prisão
perpétua!
Tiram-se, roubam-se,
todas as possibilidades destes animais não
humanos de viverem em habitats, que
naturalmente seriam diferentes da casa dos
«donos». Temos de admitir que não estamos a
protegê-los coisíssima nenhuma, nem como
espécie, nem como ser vivo, nem a permitir a
sua bio/diversidade e diferentes
possibilidades de vida.
Reconheço que amamos
os «nossos» animais e como humanos,
apresentamos uma predisposição para amar a
natureza, a vida e os seres vivos, Edward
Osborne Wilson designou esta nossa tendência
de Biofilia. Mas, massivamente e talvez
in/conscientemente, estamos a subestimar os
«nossos fiéis amigos», submetendo-os a
regras e a gostos do mais des/humano que
temos e do menos animal que somos!
Imaginem o que seria,
por analogia passear, alguém na rua, um
humano com uma coleira e uma trela.
Arriscaria a dizer, que de imediato, a este
humano seria diagnosticada com uma qualquer
patologia mental, que seria mediatizado como
uma exibição sadomasoquista!
E… pendurar as pernas
dos humanos em talhos? Como se de presuntos
se tratassem! No mínimo, consideraríamos
macabro e repudiante! Mas porque não o
consideramos com os animais não humanos?
Porque insistem, numa
atitude pseudoaltruísta, em alimentar os
pombos e os gatos nas cidades? Quando estive
na Flórida, recordo-me de ver escrito numa
sinalética: não alimente os gatos, eles
alimentam-se na natureza.
Também um dia,
disseram-me, que os canários teriam de ser
mantidos em gaiolas, porque se não, não
sobreviveriam! Considero esta generalidade
um mito (urbano), numa tentativa humana de
validar as suas opções.
Experimente libertar
uma ave e quiçá, terá mesmo a oportunidade
de observá-la a interagir com outras, na
árvore mais próxima!
Família Epigenética?
Rute Rocha
Pergunto-vos se não estará na altura de mudarmos o conceito de família? Ou tomarmos consciência que dele fazem parte uma série de mitos que nos angustiam e escravizam!
Repare-se que o termo família deriva do latim
famulus, que significa escravo doméstico.
Que
conceito é este o de família que nos estão
a querer impor?
– religioso, de matrimónio de
dois humanos ateus?!
– de laços de sangue,
que historicamente geraram tantas guerras?!
– com os mesmos genes? como se ambos os
progenitores partilhassem dos mesmos genes!
– individualista, confinada a três
elementos, de que já nem os avós e os tios
fazem parte!
– pequeno burguês? num
(pseudo)ambiente, materialista, acolhedor e
de aconchego.
Vejamos as formigas! Já nem as formigas são o que eram! Foi o nosso conhecimento que mudou. Construímos a ideia de que as formigas "obreiras/trabalhadoras" servem a formiga "rainha/mãe". Contudo, estudos recentes mostram que a função das formigas na sua comunidade não está predeterminada, depende muito dos mecanismos epigenéticos. Repare-se que ao morrer uma formiga rainha, uma obreira tomará o seu lugar, produzindo feromonas e garantindo a sobrevivência de toda a comunidade de formigas. Também os golfinhos, na grande maioria das vezes, as crias são amamentadas pelas "tias".
Todos os humanos partilham de uma genética ancestral comum, mas não faz sentido assumirmos um organismo como uma individualidade genética, estanque. Todos os animais humanos e não-humanos estão sujeitos a fatores epigenéticos, que constantemente causam alterações do DNA (material genético das nossas células) e que se perpetuam no tempo através das divisões celulares. E mais... é saudável mudar os nossos genes, é a mudança que garante a homeostasia e o bem-estar. Como António Damásio, refiro-me quer à homeostasia interna quer à homeostasia sociocultural.
Talvez pela minha formação e/ou deformação
em Biologia, projeto a família para um
conceito mais sistémico e com muito mais
(bio)diversidade, na qual,
genepool,
aprendizagens,
experiências e afetos interagem para um bem
comum.
Em
Cativeiro... estamos todos!
Rute Rocha
Nada me surpreende
relativamente aos animais viverem em
cativeiro. Em pouco mais de 500 anos, desde
os descobrimentos, invadimos biomas,
ecossistemas, nichos, habitats... todo o
espaço dito “selvagem” ... contaminando-o,
incendiando-o, negligenciando-o, abusando-o,
humanizando-o violentamente... com a
“inteligência suprema” que nos caracteriza
como Homo sapiens, anos seguidos,
dias, horas, minutos...
Toda a natureza
está humanizada. Toda ela é alterada
esteticamente em função do que é humanamente
belo e não do que é naturalmente belo. Até
as cataratas do Niágara foram previamente
determinadas a partir de uma maquete que
permitisse exibir a exuberância da força das
águas (1).
Diria mesmo, já nada me
surpreende relativamente aos animais humanos
também viverem em cativeiro. Sim, nós, os
humanos vivemos também em cativeiro como os
animais não humanos que se encontram em
zoos, aquários ou reservas da biosfera.
Viajamos em aviões como se de transporte de
cavalos se tratasse. Navegam barcos
carregados de refugiados como porcos a
caminho dos matadouros.
Quantas vezes
nos sentimos uma ovelha em rebanho, nos
festivais/feirinhas ou em megaconcertos?
Quantas vezes nos sentimos no emprego como
em um cárcere privado? Com polícia, juízes,
advogados de defesa e acusação...
E nos
prédios, cafés, centros comerciais, filas de
trânsito, em praias e jardins?
E as
nossas crianças nas escolas e em ocupação de
tempos livres? Onde memorizam com reforços
positivos ou negativos, de acordo com a
performance dos comportamentos exibidos
entre os pares, em salas que nos lembram
caranguejos em aquacultura...
Já não são
necessários estudos para percebemos que os
humanos são em número excessivo no planeta
Terra. E que este excesso de população leva
os (animais)humanos a coabitar em
cativeiros. E em cativeiro, sob os efeitos
de stress, diria mesmo em distress, as
hierarquias são exacerbadas e a competição
por fatores abióticos e/ou bióticos, em
última instância, torna-se permanente, com
uma agressividade extrema.
E como
proceder?
Ferindo as nossas
suscetibilidades mais antropocêntricas e
egocêntricas, considero que se o ser humano
baixar drasticamente a natalidade, não
haverá nem animais não humanos nem humanos
em cativeiro, nem tão pouco ativistas ou
pseudopolíticas ambientalistas. Não será
necessário!
Se continuarmos a aumentar a
natalidade será sine qua non a
con(sobre)vivência em cativeiro!
(1) SPIRN, Anne Whiston - Constructing Nature: The Legacy of Frederick Law Olmsted, in Uncommon Ground: Rethinking the Human Place in Nature, 1996, p.95.
(Des)humanidade da
Devolução
Rute Rocha
“ADOÇÃO: Foram
devolvidas 53 crianças adotadas nos últimos
três anos” (OBSERVADOR, 30/7/2019).
Qual é realmente o
objetivo deste título/artigo e “tema” que de
forma sistemática é exibido nos órgãos de
comunicação social?!
Sem querer retirar
a possibilidade de reflexão bem como
desvalorizar a gravidade de tais situações,
não consigo deixar de sentir a injustiça e a
falta de bom senso em relação a todos os
outros pais adotantes (mono ou biparentais).
Aqueles que para o «superior interesse da
criança» vivem numa vida de entrega como
qualquer pai biológico.
Já se deu
conta dos «filhos biológicos» que são
abandonados à nascença nos hospitais?
Do
número de crianças sem «paternidade», os
filhos e as filhas de «pai incógnito»?
Do número de recém-nascidos sem direito à
primeira mamada?
Onde está a
“humanidade” destes comportamentos?
Sempre preferi o conceito de animalidade
face ao conceito de humanidade. Perdoem-me
os psicólogos e os sociólogos, mas de
humanidade vamos mostrando pouco e para mim,
é um conceito com um sentido cada vez mais
pejorativo!!!
Tem ideia do número de
crianças “sem pais” que entram nas
instituições nestes três últimos anos? Já
sem referir as crianças que são acolhidas
por maus tratos e violência extrema e/ou
famílias de “sangue” que rejeitam passiva ou
ativamente os seus filhos.
Desconheço as
estatísticas, mas arriscaria a afirmar que o
número de crianças em acolhimento é
significativamente maior do que o
apresentado no título como “devolvidas”.
Choca-me a exigência da opinião pública
acerca dos adotantes face aos progenitores.
Exige-se que os pais/mães adotivos sejam
“super-heróis” perfeitos, sem dúvidas ou
hesitações…
Lembro que o período de
“gravidez” dos adotantes (períodos de espera
entre os 3 e os 6 anos) é superior ao dos
elefantes!
Recordo-me de uma grávida,
que fazia ecografias sistemáticas ao seu
feto, me perguntar porque é que os adotantes
“não querem” crianças com deficiências, “não
querem” adolescentes, “não querem” crianças
de nacionalidades diferentes…
Não creio
que existam diferenças significativas face à
animalidade de ambos, adotantes e
progenitores, quanto à vinculação afetiva
que podem desenvolver ao longo da vida com
os seus filhos, tal como nos outros animais
não humanos (com as suas crias, juvenis,
alevinos).
Se recorrêssemos mais à nossa
animalidade intrínseca e uma educação para a
parentalidade, talvez pudéssemos exibir
comportamentos mais empáticos para com os
adotantes e pelo que deve ser o «superior
interesse da criança».
A natureza dá-nos
lições… Em comunidades de golfinhos é comum
as tias amamentarem os recém-nascidos.
Em 2011, num zoo na China, um chimpanzé
fêmea adotou duas crias de tigre branco após
a passagem de um tufão e a rejeição
agressiva por parte da progenitora…
Por
fim, em modo de desafio reflexivo, como
lidamos com o abandono por parte dos filhos
biológicos quando põem os pais num lar,
muitas vezes, num abandono total, numa
espécie de “devolução”? Existem da mesma
forma títulos e artigos publicados sobre
este/s Aspectus?
Senso comunicação da ciência
Rute Rocha
Mais que fazer ciência, é importante comunicá-la e aprender a comunicar ciência. Na Biologia muito se tem comunicado sobre DNA, genes, hereditariedade ou epigenética, para investigadores, entre os pares, mas muito pouco para o senso comum.
Mas será que é realmente importante comunicar ciência? E de que forma? Aparentemente, seríamos levados a pensar que pouco importa comunicar ciência, mas de facto, a sua relevância prende-se com a minha preocupação de ultrapassar estereótipos e crenças, muito enraizadas culturalmente, que orientam os humanos para a discriminação e por várias vezes, a história mostra-nos que perderam a sua “humanidade”. Na tentativa de superar esta minha (pre)ocupação, proponho uma – Senso Comunicação – isto é, comunicar ciência (ou outra área do conhecimento) para o senso comum.
Como podemos educar para a diversidade, democracia, paz, altruísmo, sem nos ocuparmos em dar um salto para a senso comunicação da ciência?
É usual ouvirmos dizer que o filho vai ser alto como o pai ou ser mau em matemática como a mãe. Mas que conceito é este de hereditariedade? Bem sei que existem muitas características que passam à descendência. E acreditem, não passam apenas as “boas”. Isto de se pensar, que o que passa à descendência é o melhor que existe!!! Não deem isso por seguro! Tenho um filho adotado e reconheço-lhe características fenotípicas (características observáveis, expressão dos genes) bem melhor que as minhas!
Uma característica* para ser hereditária tem de apresentar uma distribuição bimodal na população. Entenda-se esta, uma distribuição com duas curvas, com duas modas (diferentes alelos
provenientes de cada um dos progenitores). Logo, se a altura e a inteligência fossem características hereditárias, como poderíamos ter jovens tão altos, com ascendentes lusitanos tão pequenos?!
É este determinismo hereditário que me assusta, pela discriminação que provoca, pela angústia que gera em cada uma das crianças que ouve sistematicamente estes raciocínios “brilhantes” dos progenitores e que por praxis se habituam a passar à descendência.
É relevante percebermos que quando as nossas células precisam de insulina, os cromossomas organizam os seus genes de modo a que os ribossomas produzam esta proteína, num mecanismo estudado e altamente complexo. Contudo, os conhecimentos associados a estes fenómenos genéticos, por si só, servem de pouco, se não chegar à maioria dos humanos, para bem do planeta e dos seres que nele coabitam.
* Uma característica genética nem sempre
é uma característica hereditária, que passa
à descendência.
Uma árvore… Uma homenagem ao Vítor
Reia*
Rute Rocha
A imagem de uma árvore carrega o simbolismo da retidão de valores, da paz e da esperança, da perpetuação da vida e das memórias. Uma casa na árvore é abrigo, segurança, mas também sonho, aventura e criatividade…
Numa abordagem científica da árvore, seríamos remetidos para a Botânica… para uma análise da sua morfologia ou descrição das suas funções vitais, falando de fotossíntese, reprodução ou trocas nutricionais.
Com crianças em início de descobertas, usaríamos os seus ciclos de reprodução ou de adaptação às diferenças de temperatura para ilustrar as estações do ano…
Poderíamos fazer uma reflexão sobre a forma como são classificadas, considerando as diferentes utilidades que lhes atribuímos… árvores de fruto, árvores fornecedoras de madeira ou de pasta de celulose, árvores pulmão, árvores sombra, árvores ornamentais…
Podíamos falar de espécies autóctones, espécies invasoras, espécies infestantes, espécies geneticamente modificadas ou até de espécies ameaçadas…
Podemos referir-nos a elas pelo seu nome comum Jacarandá, ou pelo nome científico - Jacaranda mimosifolia.
A nossa representação de árvore poucas vezes inclui os imensos seres que nelas vivem - de forma permanente ou temporária, e que fazem com que cada árvore se torne um pequeno ecossistema.
Apesar de haver árvores centenárias, sobreviventes a muitas gerações de humanos, raramente entendemos a árvore como um ser vivo.
Os nossos olhos não veem os seus movimentos por ação de fatores externos, e as árvores, a par das plantas de menor porte, são tidas como seres inanimados ou até objetos.
É com recurso à tecnologia que muito recentemente a investigação na área do «comportamento» das plantas tem dado a conhecer fenómenos que perspetivam de uma outra forma o conhecimento tido como inquestionável em relação ao reino das plantas.
Em estudos muito recentes, forma detetados movimentos de «pulsação» em algumas árvores que mostram que a variação da pressão que dá origem à deslocação interior de fluídos não é exclusivamente provocada pela ação da luz, mas sim por ciclos de movimentos «voluntários» cadenciados dos caules e das folhas, similar ao batimento cardíaco.
Também, em estudos muito recentes, percebemos que existem conexões que lhes permitem receber e transmitir informação sobre ameaças à sua integridade ou sobrevivência. Estudos de uma investigadora canadiana, revelam, que árvores mãe protegem as raízes de árvores filhas.
Este caminho de descoberta e conhecimento começou a ser trilhado e possibilita um novo olhar sobre os fantásticos seres que connosco habitam este planeta, mesmo que, por egomorfismo, o conhecimento que vamos construindo seja à semelhança do entendimento que temos de nós próprios, como espécie ou como indivíduos.
(2019-03-21)
* Vítor Reia é um nome incontornável na área da educação pelos media e da literacia. Dedicou a sua investigação científica à Literacia Fílmica, à Literacia dos Media e em Contextualizações Culturais do Cinema. Além disso foi também membro do Grupo de Peritos da Comissão Europeia em Literacia dos Media, consultor do British Film Institute para o projecto European Film Literacy, tendo participado nos Projectos da Comissão Europeia: EUROMEDUC, MEDIAPPRO e EDUCAUNET. Faleceu no dia 16 de Agosto de 2018, aos 64 anos, vítima de cancro.