Uma Pequena História da Música [58]
Ópera francesa
- Partilhar 03/09/2024
A ópera francesa do período romântico, embora tenha demorado mais tempo do que a ópera italiana a adquirir o seu cunho próprio, foi talvez a que melhor refletiu o carácter da sociedade da época. Durante o século XIX, e sempre dentro do género operístico, houve três tendências dominantes: a chamada “grande ópera”, a opereta e o drama lírico e realista.
Os anos entre 1800 e
1830 são considerados um período de
transição entre o legado operístico anterior
e a verdadeira ópera romântica francesa. Uma
nova geração de compositores, liderada por
Étienne Méhul (1763-1817) e Luigi Cherubini
(1760-1842), aplicou os princípios
desenvolvidos por Gluck para transformar a
ópera cómica num género mais sofisticado e
dramaticamente carregado.
No caso de
Méhul, o tom das suas óperas é
fundamentalmente melodramático e afastado do
cliché, talvez até ao ponto do exagero. A
sua melhor obra foi Joseph en Égypte
(1807). As óperas de Cherubini, por outro
lado, reflectem o grande domínio do
compositor sobre todos os aspetos musicais:
melodias fluidas perfeitamente adaptadas às
vozes e um bom conhecimento técnico da
instrumentação. As suas primeiras óperas
conservam ainda um estilo clássico, como
Medeia (1797), antes de sofrerem a
transformação completa que se pode observar,
por exemplo, em Les Abencérages
(1813).
OFFENBACH E A ÓPERA CÓMICA
Ao longo
do século XIX, a ópera cómica francesa
evoluiu em três fases. Na primeira delas,
até cerca de 1830, a tradição deste género
incorpora elementos populares e enriquece-se
com outros provenientes da ópera romântica.
A cena é dominada por dois compositores
rivais, Nicolo Issouard (1775-1818) e Adrien
Boieldieu (1775-1834). Durante a segunda
fase, a ópera cómica atingiu um tal grau de
desenvolvimento que competiu com a “grande
ópera”, assimilando alguns dos elementos que
esta última rejeitava. Um bom representante
desta fase é Daniel Auber (1782-1871), com a
sua melhor obra, Fra Diavolo
(1830). Finalmente, a terceira fase da
evolução da ópera cómica coincide com o
período do Segundo Império; foi então que o
género se dividiu em duas vertentes muito
diferentes: uma que conduziu ao drama
lírico, e outra à opereta, à revista e às
variedades.
Jacques Offenbach (1819-1880)
é o representante mais caraterístico da
ópera cómica e da opereta. As suas obras são
uma paródia, um escárnio e uma caricatura
que procuram divertir e desafiar a censura
pelas suas alusões e ataques políticos. Com
mais de uma centena de peças, destacam-se
La belle Hélène (1864), La vie
parisienne (1866) e La Périchole
(1868). No final da sua vida, compôs uma
ópera fantástica, Les contes d'Hoffmann
(1881), que evoca as obras do início do
movimento romântico.
MEYERBEER E A
“GRANDE ÓPERA”.
Falar da
“grande ópera” francesa é falar de luxo e de
pompa, de grandes efeitos dramáticos, tanto
musicais como cénicos, para impressionar o
público, de um tom geral grandiloquente e de
grandes vozes que não poupam no seu
espetáculo, de grandes movimentos de massas
e de bailados sumptuosos.
Foi Giacomo
Meyerbeer (1791-1864) que lançou as bases
deste tipo de ópera, imbuída de um certo
romantismo conservador. Graças à sua
formação com mestres alemães e italianos, o
seu estilo musical combinava o sentido de
harmonia dos primeiros com a inspiração e a
expansão melódica dos segundos. As suas duas
melhores obras são Robert le diable
(1831) e Les Huguenots (1836). A
primeira é uma ópera tipicamente romântica,
ambientada na Idade Média e dominada por
elementos fantásticos, marcada pela luta do
homem contra as forças do mal. A segunda,
criticada por muitos pelo uso excessivo de
efeitos espetaculares, é considerada por
outros como uma das maiores obras da “grande
ópera” francesa.
GOUNOD, E O DRAMA
LÍRICO
Em meados do
século, o espírito tradicional da ópera
romântica teve a sua continuação no drama
lírico, que fundiu elementos da “grande
ópera”, da ópera cómica e até da tragédia
lírica de Lully. Como continuação do
espírito romântico, os temas preferidos do
drama lírico são a história, as lendas e os
episódios fantásticos, mas a estes juntam-se
mais tarde fontes do romance e do realismo.
As óperas de drama lírico são obras que não
pertencem nem ao género sério nem ao cómico.
Trata-se de composições dramáticas refinadas
e precisas, que se orientam para as
personagens e são psicologicamente
carregadas. O iniciador do drama lírico é
Charles Gounod (1818-1893) e a sua obra mais
representada, Fausto (1859), que
foi a primeira a atingir o sucesso,
baseia-se no drama de Goethe
Adaptado por Francisco Gil,
A partir de um texto de J.L.Iriarte
Charles Gounod: Faust (1859)
conducted by Alain Altinoglu
Opera national de Paris: 2011
Uma Pequena História da Música
- Ano VI • 63 • setembro 2024