Uma Pequena História da Música [37]

Johann Sebastian Bach

Austeridade, espiritualidade, perfeição técnica e beleza artística são algumas das características mais marcantes que definem a música de Bach (1685-1750). Mas todas elas não seriam nada sem o seu génio, que o levou a ultrapassar os limites do barroco e a tornar-se um dos maiores compositores de todos os tempos.

Em 1685, nasceu em Eisenach, no leste da Alemanha, o oitavo filho de Johann Ambrosius Bach. Batizado Johann Sebastian, viria a tornar-se o membro mais proeminente de uma família com uma longa tradição musical: o seu pai era um famoso instrumentista e os seus tios eram compositores e músicos profissionais.

NASCIDO ENTRE MÚSICOS
Foi provavelmente o seu pai que lhe ensinou a tocar violino e os primeiros fundamentos da música, uma vez que tocava vários instrumentos e trabalhava como pianista de concertos na sua cidade natal. O seu irmão mais velho Johann Christoph, com quem passou a viver quando ficou órfão aos dez anos de idade e que lhe ensinou composição, teoria musical, tocar órgão e cravo, contribuiu para a sua aprendizagem.
Aos quinze anos, ingressou na escola coral de S. Miguel, em Lüneburg. Durante os dois anos que aí passou, parece que teve a oportunidade de conhecer organistas de renome, ter acesso aos melhores órgãos da época e aperfeiçoar a sua técnica como organista.

INÍCIO COMO ORGANISTA
Em 1703, Bach conseguiu um lugar como músico de capela na corte de Weimar e, sete meses mais tarde, como organista na igreja de S. Bonifácio em Arnstadt. Iniciou então as suas composições para órgão e a sua conhecida Tocata e Fuga em Ré menor parece datar deste período. O talento de Bach e a sua forma de tocar órgão eram espantosos, mas o cargo exigia também que fosse mestre de coro. Surgiram conflitos com as autoridades e a situação agravou-se ainda mais quando Bach se ausentou durante vários meses para visitar o compositor e organista Dietrich Buxtehude em Lübeck e assistir a um dos seus concertos. Bach fez a viagem a pé, tendo de percorrer quatrocentos quilómetros de ida e volta.
Em 1707, Bach mudou-se para Mühlhausen como organista e, no mesmo ano, casou-se com a sua prima em segundo grau Maria Barbara Bach, com quem teve sete filhos, quatro dos quais sobreviveram.

A CORTE DUCAL DE WEIMAR
A fama de Bach foi crescendo e, em 1708, foi convidado a tocar para o Duque de Weimar, que lhe ofereceu o lugar de organista e músico de câmara e, mais tarde, de concertino (o concertino é o solista da primeira secção de violinos). Foi um período frutuoso em que desenvolveu grande parte das suas composições para teclado e orquestra, vários prelúdios e fugas, estudou os grandes compositores italianos e fez arranjos para órgão e cravo dos concertos de Vivaldi.
Em 1716, por ocasião da morte do mestre de capela da corte de Weimar, Bach candidatou-se ao lugar vago, mas o duque recusou e o músico demitiu-se dos cargos que ocupava. Este facto enfureceu de tal forma o duque que mandou prender Bach e encarcerá-lo durante um mês, após o que foi demitido sem cartas de recomendação.

A CORTE DE CÖTHEN
Após este contratempo, Bach aceitou o cargo de mestre de capela na corte do príncipe Leopoldo de Cöthen. O seu novo patrono era ele próprio músico e apreciava o talento de Bach. A maior parte da música que criou neste período era de carácter secular. Os seis Concertos de Brandeburgo, por exemplo, datam deste período. Em 1720, a mulher de Bach morreu subitamente e, um ano mais tarde, o músico conheceu Anna Magdalena Wilcke, uma jovem soprano da corte. Casaram-se em 1721 e tiveram treze filhos, seis dos quais sobreviveram.

EM LEIPZIG
Em 1723, o músico recebeu uma proposta de Leipzig para se tornar professor de canto na Thomasschule e diretor musical das principais igrejas da cidade, oferecendo-lhes todas as semanas uma nova peça de música sacra para os serviços dominicais e festivos. Foi um período intenso em que compôs a maior parte da sua obra, mas Bach queixava-se do seu baixo salário e das intrigas políticas a que estava sujeito.
Em 1733, no auge da sua carreira e procurando melhorar a sua situação, Bach enviou ao Eleitor da Saxónia, August Il, o Kyrie e Gloria de uma Missa em Si menor que estava a compor, acompanhando estas peças com um pedido de um cargo na corte, mas a sua tentativa foi infrutífera.
Em 1741 entra numa nova fase de composição, da qual resultam as suas duas últimas obras: Oferenda Musical (Das Musikalische Opfer, BWV 1079) e A Arte da Fuga (Die. Kunst der Fuge, BWV 1080).
Em 1749, a sua saúde estava muito debilitada, pois teve de ser submetido a duas operações e a numerosas intervenções para curar uma infeção ocular que o estava a deixar cego. No verão de 1750, devido às complicações causadas por estes tratamentos, Bach morre com sessenta e cinco anos.

MESTRE DE TODOS OS GÉNEROS
Tentar sintetizar a obra de Bach é uma tarefa quase impossível, tanto pela sua extensão como pela sua variedade. Pode dizer-se que o estilo deste grande mestre do contraponto é uma síntese de elementos do passado e dos estilos praticados no seu tempo por italianos, franceses e alemães, mas unificados e reinventados pelo seu génio criativo.
Numa época em que o estilo galante, algo frívolo e maneirista, ganhava terreno em todas as artes, Bach não se deixou arrastar por esta tendência e nas suas composições manteve sempre a procura de uma expressão elevada e cheia de espiritualidade, caraterística valorizada e apreciada por outros músicos, tanto contemporâneos como posteriores, mas que não foi muito bem recebida pelo público.
As suas composições abrangem quase todos os géneros e formas do seu tempo, vocais e instrumentais.
Nelas sintetizou elementos de diversas origens, combinando-os com o seu gosto pela polifonia contínua, o seu esplêndido domínio do contraponto, que dominava como nenhum outro compositor, a sua predileção pela sistematização e codificação, e o seu perfeito conhecimento das técnicas e características de instrumentos como o órgão, o violino e o cravo.
Todos estes elementos, filtrados pelo crivo do seu génio e talento musicais, produziram um estilo único e inconfundível, mesmo inovador, que abriu caminho para a música do futuro e influenciou muitos compositores posteriores. Com a música de Bach, esplêndida, solene e irrepetível, o período barroco chegou ao fim.

MÚSICA VOCAL
Embora a sua produção tenha sido mais extensa, apenas sobreviveram 482 obras completas deste género. Destas, cerca de 200 são cantatas, a maioria das quais escritas em Leipzig. Estas composições, divididas em versos autónomos, baseiam-se em textos de inspiração muito diversa (luterana, salmos bíblicos, simbolista, etc.), concebidos como verdadeiros libretos de ópera. A estrutura da ópera é também lembrada pelo contraste que cria entre as árias e os conjuntos de solos, sendo a parte coral geralmente colocada no início e no fim da peça.
Compôs seis missas curtas. Nelas, o Kyrie adquire um desenvolvimento importante semelhante ao primeiro andamento da sonata, com grandes fugas corais e construções complexas. O resto da missa é mais expressivo e consiste numa sucessão de árias e conjuntos corais. A mais grandiosa é a já mencionada Missa em Si menor, concebida como um drama simbólico evocando a tragédia do Calvário e construída como uma gigantesca cantata em vinte e quatro andamentos independentes, incluindo quinze coros, geralmente a cinco vozes e muitas vezes com fugas.
Em 1724, Bach escreveu a sua Paixão segundo S. Mateus, um magnífico oratório em que a violência dos sentimentos e o sentido dramático fizeram dele uma das maiores obras do compositor, tanto pela sua dimensão como pelos meios utilizados. Para além disso, entre 1734 e 1736, escreveu três outros oratórios: o Oratório da Ascensão, o Oratório da Páscoa e o Oratório de Natal.
Para encerrar este capítulo da música vocal, devemos mencionar sete motetos, especialmente Jesu meine Freude, uma esplêndida lição de contraponto composta para coro a cappella a cinco vozes.

MÚSICA INSTRUMENTAL
A obra instrumental de Bach, composta por cerca de quinhentas peças, poderia ser objeto de um tratado inteiro sobre esta arte. Para a estudar de forma ordenada, costuma-se dividi-la de acordo com o instrumento dominante: obras para órgão de carácter secular (prelúdios, fugas, tocatas e fantasias) e cerca de 150 corais de carácter litúrgico; obras para cravo, onde se pode apreciar a originalidade do compositor, a sua vontade de experimentar e o seu domínio do contraponto; obras para instrumentos solistas (flauta, violino e violoncelo), onde o génio de Bach se manifesta em todo o seu vigor; e obras para conjuntos orquestrais (Concertos de Brandenburgo).

Adaptado por Francisco Gil,
A partir de um texto de J.L.Iriarte

A Missa em Si menor de Bach, interpretada pela Netherlands Bach Society. Entre um inspirador Kyrie e o jubiloso final Dona nobis pacem, há nove árias e duetos completamente únicos, catorze impressionantes secções de conjunto para quatro, cinco, seis e até oito vozes, um amplo espetro de solos instrumentais e uma incrível variedade de estilos.


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