Uma Pequena História da Música [5]
Cantigas e música secular
- PDF 24/07/2023
Os primeiros cancioneiros de
música profana medieval datam dos
séculos XII e XIII, e embora as fontes
documentais saibam que este tipo de
música também foi produzido mais cedo, a
sua existência não foi registada nos
códices, ao contrário da música
religiosa.
No início do
século XI, surgiu no sul de França, do
Condado de Périgord à Catalunha e à
Provença, a lírica trovadoresca, a mais
antiga manifestação de música secular
culta que subsiste no Ocidente. Os
trovadores criaram canções que
combinavam melodias e textos poéticos
escritos na língua da região, ou seja, o
occitano (língua românica falada no sul
da França). O tema principal desta
poesia lírica era o amor cortês, mas
também se abordavam temas de cavalaria e
feitos heroicos.
Algumas décadas mais
tarde, no norte de França, surgiram
novas cantigas trovadorescas, com
características semelhantes às
anteriores, mas escritas na língua
românica dessa zona geográfica (norte de
França), o odile. Era uma cantiga um
pouco mais simples do que o occitano e,
embora também tratasse dos mesmos temas,
dava ênfase a aspetos mais populares. Os
trovadores utilizavam diferentes formas
poéticas, geralmente acompanhadas de
refrões ou estribilhos.
MELODIA E
POESIA
A lírica trovadoresca
difundiu-se rapidamente nas cortes
europeias, atingindo o seu apogeu na
segunda metade dos séculos XII e XIII.
Em cada lugar, essa lírica foi expressa
na língua românica autóctone, que também
adquiriu características peculiares.
As melodias eram muito variadas,
baseadas em composições religiosas, mas
mais ousadas, mais rápidas e mais
alegres. Tinham uma textura monódica com
acompanhamento instrumental. Os textos,
sendo escritos em língua românica,
permitiam o desenvolvimento de
diferentes fórmulas rítmicas com
alternância entre notas longas e curtas.
TROVADORES FAMOSOS
Entre os
grandes e mais ilustres trovadores
gauleses contam-se Guilherme IX de
Poitiers, Marcabrú, Raimbaut de
Vaqueiras, Peire Vidals, Chrétien de
Troyes e Adam de la Halle. Embora este
género de poesia lírica não fosse
exclusivo dos homens, algumas mulheres
aderiram a este tipo de poesia, como
Beatriz de Die, Azalaïs de Porcairagues
e Blanche de Castela. Outras, como
Eleanor de Aquitânia, contribuíram como
protetoras dos trovadores da sua corte.
Na Alemanha, os trovadores eram chamados
minnesänger (cantores de amor) e entre
eles encontravam-se Rudolf von Neuenburg
e Walther von der Vogelweide.
A
Espanha também aderiu ao movimento
trovadoresco, no qual se destacaram
figuras como Martín Códax, Guillem de
Berguedà, e, sobretudo, o rei Afonso X,
o Sábio. Em Portugal, Fernão Rodrigues
de Calheiros foi um grande impulsionador
do galaico-português, e sobretudo o rei
D.Dinis. Se bem que o percurso de alguns
trovadores, até pelo seu estatuto de
figuras públicas, seja bem conhecido, em
relação a muitos outros, e também em
relação à maioria dos jograis (indivíduo
que, na Idade Média, tocava vários
instrumentos e cantava versos seus ou
alheios, sendo pago para tal), os dados
biográficos existentes são escassos ou
mesmo nulos.
CANTIGAS
A
melhor representação do estilo
trovadoresco na Península Ibérica são as Cantigas
de Santa Maria, de Afonso X o Sábio.
São 432 composições monódicas que narram
milagres e favores da Virgem. As
melodias destas cantigas reúnem
diferentes tendências musicais, desde
modelos litúrgicos gregorianos aplicados
a textos em língua românica até outros
de carácter popular.
Afonso X foi um
grande mecenas da música e criou a
cátedra de música na Universidade de
Salamanca (1254). Foi também protetor e
admirador de muitos trovadores, como
Bonifácio Calvo, Guiraut, Riquier e
Guillén de Cervera. Rei de um território
onde conviviam cristãos, judeus e
muçulmanos, Afonso X, ao contrário da
grande maioria dos monarcas europeus da
época, protegeu o património cultural de
todas as culturas. As obras criadas sob
o seu patrocínio constituem uma fonte
inigualável de conhecimento dos
instrumentos utilizados no seu tempo,
graças às miniaturas que contêm.
Adaptado por Francisco Gil,
A partir de um texto de J. L.
Iriarte
Cantigas de Santa Maria project - Alfonso X of Castile El Sabio (1221–1284). Cantiga-No 1.
Uma Pequena História da Música
- n.50• julho 2023