Uma Pequena História da Música [4]
Hildegarda de Bingen
Foi uma das figuras mais influentes, multifacetadas e surpreendentes do final da Idade Média. Detentora de uma vasta cultura científica e artística, foi compositora, escritora, médica naturalista, abadessa e uma das mais ilustres representantes do monaquismo feminino medieval.
Hildegarda de
Bingen (1098-1179) nasceu em Bemersheim,
uma cidade do vale do Reno. Era a mais
nova de dez filhos de uma família nobre
alemã. Diz-se que foi uma criança débil
e doente e que, aos três anos de idade,
teve a sua primeira visão mística. Os
seus pais eram muito religiosos e,
quando a criança tinha oito anos,
ofereceram-na à Igreja e colocaram-na
sob os cuidados da Condessa Jutta de
Sponheim, abadessa de um mosteiro
beneditino perto de Bingen. Esta
instruiu-a na oração, no canto
gregoriano e na leitura do latim. Com a
morte de Jutta, em 1136, Hildegarda foi
nomeada a nova abadessa do mosteiro.
A SIBILA DO RENO
Embora os
episódios visionários tenham continuado
ao longo da sua vida, foi em 1141 que
Hildegarda teve uma experiência
particularmente intensa: viu línguas de
fogo a descerem do céu em direção a ela
e Deus ordenou-lhe que deixasse um
registo escrito de todas elas. A partir
daí, escreveu várias composições e
poemas nos quais explicava tudo o que
via e sentia. A principal obra deste
género é Scivias, que se divide
em três livros.
Foram
precisamente as suas experiências
visionárias que lhe deram a fama de
estar em contacto com o divino e lhe
permitiram exercer uma influência e uma
autoridade invulgares para uma mulher do
seu tempo, como o prova a sua
correspondência com importantes
personalidades políticas e eclesiásticas
que a ela recorriam para obter conselhos
e orientações daquela a quem chamavam a
"Sibila do Reno".
Outra prova da sua influência é o
facto de ter sido a primeira e única
mulher do seu tempo a obter autorização
das autoridades eclesiásticas para
pregar, o que fez durante quatro viagens
pela Alemanha, e também a autorização
para fundar dois mosteiros, um feito
extraordinário para uma mulher.
MOVIDA PELO SOPRO DIVINO
Combinando a
sua paixão pela poesia e pela música,
Hildegarda foi uma das mais produtivas
compositoras medievais e o seu
repertório musical é um dos mais
extensos. Considerava-se “uma pena
movida pelo sopro divino”, uma mística
mais do que uma compositora. Mas as suas
composições são muito elaboradas e
mostram uma combinação perfeita de
melodia e texto, sempre profundamente
religiosos; são geralmente criadas para
vozes solistas. A sua produção musical
inclui 78 belíssimas obras que compilou
sob o título Sinfonia da Harmonia
das Revelações Celestes, que
foi ampliando ao longo dos anos com mais
canções e hinos. Compôs também um drama
litúrgico ou moral com música, Ordo
virtutum,
que é um discurso sobre as virtudes.
ESCRITORA PROLÍFICA
Para além das
suas composições musicais e livros sobre
visões, Hildegarda foi uma escritora
prolífica, cujas obras revelam a
estreita aliança entre ciência e arte.
Os seus escritos científicos incluem um
tratado de medicina (Causae et curae),
no qual descreve a origem das doenças e
o seu tratamento, e outro de história
natural (Physica), no qual mostra grande
interesse pelas propriedades curativas
das plantas, animais e rochas.
Escreveu também obras sobre moral e
teologia, linguística, poesia e uma
extensa coleção de cartas (cerca de 300
cartas) sobre os mais diversos assuntos.
Esta mulher prolífica, sem dúvida muito
à frente do seu tempo, morreu a 17 de
setembro de 1179, com 81 anos, no
mosteiro de Rupertsberg. Diz-se que, na
hora da sua morte, apareceram no céu
dois arcos luminosos que se cruzaram,
formando uma cruz.
Adaptado por Francisco Gil,
A partir de um texto de J. L.
Iriarte
Ordo Virtutum, de Hildegard von Bingen (12th
century)
Conductor: Hendrik Vanden
Abeele
Singers: Veerle Van Roosbroeck,
Sarah Van Mol, Lisa De Rijcke, Lieselot De
Wilde, Kerlijne Van Nevel, Elisabeth Colson,
Michaela Riener.
Uma Pequena História da Música
- n.50• julho 2023