à Deriva
Fernando Vieira
Temei os tremores
- Partilhar 11/11/2022
Coincidência ou não,
por alturas da passagem do 267º aniversário sobre o
devastador terramoto de 1 de novembro de 1755 foi
registado um significativo aumento de ocorrências
sísmicas, sobretudo ao largo da costa algarvia,
nomeadamente a SW de Albufeira e no sempre agitado
Banco de Gorringe, a cerca de 120 milhas marítimas a
oeste-sudoeste do Cabo de São Vicente e perigoso
sensor da atividade resultante da fricção entre as
placas tectónicas europeia e africana.
Não é
propósito desta crónica (longe de mim…) atiçar
alarmismos especulativos, mas certo é que nós - os
algarvios e aqueles que por cá andam – vivemos num
autêntico “barril de pólvora que um dia vai
explodir”, segundo Mário Lopes, engenheiro
especializado em sismos e professor no Instituto
Superior Técnico, segundo o qual “falta fiscalização
das normas relativas à resistência sísmica” e,
portanto, a prevenção terá que começar nos cidadãos,
exigindo essas condições quando vão habitar uma
casa.”
No caso concreto do Algarve, a
explosão imobiliária verificada entre as décadas de
1970 e 1990, devida principalmente à demanda
turística, originou o surgimento de milhares e
milhares de edifícios projetados sob critérios
demasiado displicentes, cuja fiscalização por quem
de direito foi, na esmagadora maioria dos casos, tão
ou mais permissiva.
E, no entanto, legislação
é coisa que não falta, pelo menos desde 1958,
visando aumentar o grau de exigência no
dimensionamento dos projetos. O que falta é uma
preocupação genuína por quem tem tido ao longo deste
lapso de tempo a obrigação de fazer cumprir à risca
as normas estabelecidas, a bem daqueles que habitam
nesta região.
Voltando ao especialista a que
recorro para basear este breve artigo, Mário Lopes
lamenta andar há cerca de duas décadas a ‘pregar aos
peixes’, na defesa da construção de edifícios e
infraestruturas de engenharia civil preparada para
resistir a abalos telúricos. Um alerta que pretende,
apenas e simplesmente, reduzir em dez vezes o número
de vítimas e danos materiais resultantes dos mais
que prováveis tremores de terra de grande amplitude
e subsequentes maremotos (tão devastadores na costa
algarvia em 1755) a que estamos sujeitos.
Por
tudo isto, uma coisa vos confesso: se há fenómeno
natural de que tenho assumido pavor é o tremor de
terra, pois sei bem o sério risco que corro ao morar
paredes meias com o Rio Arade, a fissura tectónica
que liga Portimão a Silves.
Enquanto folgam
as costas, resta-nos alertar as entidades
responsáveis e os principais atores do setor da
construção civil e afins, cobrando-lhes o
intransigente cumprimento das regras do jogo.
- n.42 • novembro 2022