Fernando Vieira

à Deriva

Fernando Vieira

Temei os tremores

Coincidência ou não, por alturas da passagem do 267º aniversário sobre o devastador terramoto de 1 de novembro de 1755 foi registado um significativo aumento de ocorrências sísmicas, sobretudo ao largo da costa algarvia, nomeadamente a SW de Albufeira e no sempre agitado Banco de Gorringe, a cerca de 120 milhas marítimas a oeste-sudoeste do Cabo de São Vicente e perigoso sensor da atividade resultante da fricção entre as placas tectónicas europeia e africana.

Não é propósito desta crónica (longe de mim…) atiçar alarmismos especulativos, mas certo é que nós - os algarvios e aqueles que por cá andam – vivemos num autêntico “barril de pólvora que um dia vai explodir”, segundo Mário Lopes, engenheiro especializado em sismos e professor no Instituto Superior Técnico, segundo o qual “falta fiscalização das normas relativas à resistência sísmica” e, portanto, a prevenção terá que começar nos cidadãos, exigindo essas condições quando vão habitar uma casa.”

No caso concreto do Algarve, a explosão imobiliária verificada entre as décadas de 1970 e 1990, devida principalmente à demanda turística, originou o surgimento de milhares e milhares de edifícios projetados sob critérios demasiado displicentes, cuja fiscalização por quem de direito foi, na esmagadora maioria dos casos, tão ou mais permissiva.

E, no entanto, legislação é coisa que não falta, pelo menos desde 1958, visando aumentar o grau de exigência no dimensionamento dos projetos. O que falta é uma preocupação genuína por quem tem tido ao longo deste lapso de tempo a obrigação de fazer cumprir à risca as normas estabelecidas, a bem daqueles que habitam nesta região.

Voltando ao especialista a que recorro para basear este breve artigo, Mário Lopes lamenta andar há cerca de duas décadas a ‘pregar aos peixes’, na defesa da construção de edifícios e infraestruturas de engenharia civil preparada para resistir a abalos telúricos. Um alerta que pretende, apenas e simplesmente, reduzir em dez vezes o número de vítimas e danos materiais resultantes dos mais que prováveis tremores de terra de grande amplitude e subsequentes maremotos (tão devastadores na costa algarvia em 1755) a que estamos sujeitos.

Por tudo isto, uma coisa vos confesso: se há fenómeno natural de que tenho assumido pavor é o tremor de terra, pois sei bem o sério risco que corro ao morar paredes meias com o Rio Arade, a fissura tectónica que liga Portimão a Silves.

Enquanto folgam as costas, resta-nos alertar as entidades responsáveis e os principais atores do setor da construção civil e afins, cobrando-lhes o intransigente cumprimento das regras do jogo.