Fernando Vieira

à Deriva

Fernando Vieira

Dona Ana sem bandeira

O que chama a atenção na lista de atribuição da Bandeira Azul para a próxima temporada balnear é a saída da Praia de Dona Ana, uma das mais afamadas estâncias balneares da região algarvia.

Região algarvia que, por sinal, continua a dominar a listagem nacional, com 86 bandeiras destinadas às praias, a que se juntam quatro marinas (Lagos, Portimão, Albufeira e Vilamoura) e duas embarcações de ecoturismo, a grande novidade deste ano, ambas sediadas em Portimão.

Merece referência o concelho de Albufeira, com 25 praias (o recordista nacional), seguido por Vila do Bispo (11), Loulé (10), Portimão e Lagoa (6), Aljezur, Faro, Olhão, Tavira e Vila Real de Santo António (4), Lagos (3), Castro Marim (3) e Silves (2).

Contas feitas, causa alguma espécie o desaparecimento da Praia de Dona Ana, alvo em 2015 de uma radical intervenção para suster o avanço do mar e que gerou forte controvérsia, sobretudo no seio da comunidade local, com muita contestação à mistura e o posicionamento de diversas entidades ligadas à preservação do ecossistema.

O Ministério do Ambiente foi mesmo acusado de protagonizar um “grave e premeditado crime”, ao proceder à dragagem e descarga de “toneladas de areia de qualidade miserável”, que soterraram “o mundo submarino e a paisagem marítima”, tendo sido igualmente criticada a construção de um dique com 50 metros.

Segundo fontes oficiais da própria edilidade lacobrigense, a não candidatura à Bandeira Azul 2022 prende-se com a ETAR de Lagos, cujas condutas estarão permeáveis à entrada de água salgada nos pontos onde o nível do mar está acima do saneamento, o que origina dificuldades no seu tratamento e afetaria as análises previstas para o período de avaliação referente ao galardão deste ano.

Apesar da qualidade da água na Praia de Dona Ana ser considerada pelas autoridades municipais “boa ou mesmo muito boa”, certo é que esses resultados analíticos impediram, muito provavelmente, a atribuição da Bandeira Azul para a época balnear que se avizinha.

Poderia achar esta situação, supostamente pontual, como aceitável, caso não viesse da própria autarquia a previsão de que só daqui a um par de anos o problema deverá estar definitivamente sanado, após o investimento que a empresa Águas do Algarve está a fazer na ETAR em causa.  

Poderia até desvalorizar a ausência da Bandeira Azul ondulando neste belo recanto da costa barlaventina, se levar em linha de conta a garantia de que a Praia de Dona Ana não perdeu nenhum dos seus predicados em termos de qualidade, segurança e controle da água.

Poderia mesmo ignorar este tema, sabendo que a Câmara de Lagos tomou a iniciativa de nem sequer candidatar a mais famosa estância balnear do concelho ao prestigiado galardão, instituído há 35 anos pela União Europeia, e sabendo de antemão que os indicadores são bastante exigentes.

Mas não devo esquecer que semelhante impasse se verificou em recentes anos nas praias da Batata e do Camilo, também elas padecendo de maleitas do género, mantendo-se incólumes a acidentes de percurso, apenas, a Praia da Luz, Porto de Mós e a Meia Praia.

Portanto, o facto daquela que foi eleita em 2013 como “a melhor praia do mundo” (pela revista espanhola Condé Nast Traveller) estar arredada da Bandeira Azul, sabe-se lá por quanto tempo, é algo que me custa a engolir, pois há ‘imprevisibilidades’ que são previsíveis, como parece ser o caso.