Espelho Cinemático
Emily (2022)
Emily é a biopic
mais recente a passar pelas salas de cinemas
nacionais. O filme sobre a poetisa e
escritora Emily Jane
Brontë estreou em setembro do ano passado no
Festival Internacional de Toronto, mas
apenas chegou às salas de cinema portuguesas
a 30 de março de 2023. O filme marca a
estreia da atriz Frances O’Connor (Mansfield
Park, Bedazzled,
A.I. Artificial
Intelligence)
enquanto realizadora e guionista. Emily
é protagonizado por Emma Mackey e o elenco
inclui ainda Fionn Whitehead, Oliver
Jackson-Cohen, Alexandra Dowling e Gemma
Jones.
Emily não é um filme
biográfico tradicional, mas sim uma
exploração fílmica com várias liberdades
artísticas que procura entender o mundo de
Emily Brontë e como escreveu Wuthering
Heights (título português: O Monte
dos Vendavais) - o primeiro e único
livro que publicou. Emily nasceu a 30 de
julho de 1818 em Thornton, Inglaterra e
viria a morrer precocemente aos 30 anos
vítima de tuberculose. Em 1847, apenas um
ano antes da sua morte, publicou
Wuthering Heights, um romance
não-convencional para a época vitoriana da
altura, repleto de personagens egoístas
completamente rendidas às suas paixões,
ódios e vícios.
Os
Brontes eram uma família intelectual e a
História viria a imortalizar as irmãs Brontë
(Anne, Charlotte e Emily) no cânone
literário ocidental pela qualidade das suas
obras. Inicialmente, as irmãs Brontë
assinavam as publicações com pseudónimos
masculinos, mas Charlotte Brontë revelou as
identidades após a morte das duas irmãs mais
novas. Agora, Frances O’Connor propôs-se a
colocar Emily no centro da narrativa e
explorar como esta jovem mulher tímida -
caracterizada como “a estranha” das irmãs -
encontrou a sua voz e escreveu um dos
clássicos mais irreverentes de sempre.
O
filme inicia-se com o fim, com Emily às
portas da morte e Charlotte
a questioná-la sobre
como conseguiu escrever algo como
Wuthering Heights. Este questionamento
essencial de como, porquê e donde surge a
inspiração para escrever paira e infiltra
todo o filme. É necessário viver para saber
escrever algo com substância. Mas, Emily é
uma pessoa difícil, solitária e desajustada
que não consegue lidar com a normalidade da
vida. Frances O’Connor entrelaça a verdade
com o imaginário para desvendar Emily
Brontë, dando a conhecer a relação com a
Anne e Charlotte, as irmãs e únicas amigas
que teve; com o pai, o pároco sério e rígido
da aldeia; com Branwell, o irmão artístico
alcoólico; e, por fim, a relação imaginada
com William Weightman, um assistente
paroquial que efetivamente viveu com os
Brontë durante alguns anos.
O
filme é, no fundo, a vida de Emily Brontë
re-imaginada pelo olhar de Frances O’Connor
que preenche os vazios e dá forma ao
espírito da autora. Emily é um filme
sobre a luta contra a máscara social imposta
pelos outros e sobre sair do casulo para
começar realmente a viver. Mas, acima de
tudo, Emily é um grande romance, é a
rendição total à paixão, tal como em
Wuthering Heights. É um filme sensual,
tempestuoso e bucólico em que paixão e ódio
deixam os nervos à flor da pele das
personagens.
Emily foge à rigidez tanto
do filme biográfico como do filme de época
ao permitir-se ser livre em imaginação e
expressão, que opta por um estilo
cinematográfico mais simples e livre, sempre
em movimento, filmado com steadycams em
Yorkshire, o condado nativo dos Brontës.
Emma Mackey venceu o aclamado prémio BAFTA
Rising Star no início de 2023 pelo seu
desempenho formidável no papel principal.
Destaca-se também o ator
Oliver Jackson-Cohen no
papel de William Weightman, o amante de
Emily Brontë.
Emily
é um filme biográfico não-convencional sobre
uma mulher não-convencional. É um filme
sobre amor e arte que pode ter passado
despercebido por entre os grandes êxitos de
bilheteria, mas quem o viu reconhece o seu
valor.
Classificação: ★★★★