Contemplações
Francisco Gil
Botero, o artista das formas arredondadas
- Partilhar 22/11/2023
Fernando Botero, é o artista mais
universal da Colômbia, famoso em todo o
mundo pelas suas figuras arredondadas e
volumosas.
O mestre Botero, nasceu
em Medellín em 1932, tendo falecido em
setembro do 2023 na sua casa no Mónaco
aos 91 anos de idade. Foi um artista
autodidata em todos os sentidos da
palavra. "A arte deve produzir prazer,
uma certa tendência para um sentimento
positivo", disse em 2019 numa
entrevista ao jornal EL PAÍS. "Mas eu
pintei coisas dramáticas. Sempre
procurei a coerência, a estética, mas
pintei violência, tortura, a paixão de
Cristo... Há um prazer diferente na
pintura dramática, na pintura em si. A
maior alegria da pintura, a beleza, não
põe em conflito o dramático e o
prazeroso", disse na altura.
O
longo caminho de Botero teve muitas
paragens ao longo do percurso. De
origens muito humildes, a sua carreira
começou como ilustrador do jornal El
Colombiano no final da década de 1940.
Desde cedo se reconheceu como um
herdeiro de Piero della Francesca, e a
génese do seu estilo inconfundível
surgiu aos 25 anos, com um esboço de um
bandolim que indicava o seu sentido de
monumentalidade. Considerado durante
muito tempo um dos maiores artistas
vivos, a fama e a popularidade que
adquirira com as suas pinturas de cores
luminosas aumentaram nos anos 90,
quando as suas enormes esculturas em
bronze começaram a ser expostas nas
principais capitais do mundo. Um estilo
que nunca abandonou, e que manteve até
ao último dos seus dias.
Na
década de 60, Botero passou por Nova
Iorque, onde esteve num dos mais
importantes laboratórios da vanguarda
artística contemporânea, onde chegou
com 200 dólares no bolso. Conta que, a
certa altura, durante esses anos
difíceis, só lhe restavam 27 dólares na
conta poupança. Botero com trinta e
poucos anos, enfrentou nesse tempo as
correntes predominantes na altura.
Sentiu-se incompreendido, mas manteve a
coragem, para se orientar no seu
percurso e para aperfeiçoar o domínio
da sua técnica. Naquela época,
predominavam a arte abstrata, o
expressionismo abstrato e a arte pop,
mas o colombiano já tinha escolhido uma
direção diferente. As vozes críticas
também o acompanharam ao longo da sua
extraordinária carreira.
Nos
anos 70, mudou-se para Paris, onde foi
atingido pela maior das tragédias. Aos
quatro anos, viu Pedro, o filho do seu
segundo casamento, morrer num acidente
de viação. O próprio Botero perdeu
parte da mão direita, ficou incapaz de
pintar durante vários meses. Fechou-se
no seu estúdio para recriar
repetidamente o rosto do seu Pedrito
(série de obras que se encontram no
Museo de Antioquia, Medellín, Colômbia).
Apesar de ter vivido no México, Nova
Iorque, Mónaco e Paris, Botero nunca
perdeu de vista o seu país. As suas
memórias de infância do mundo de
Medellín nas décadas de 1930 e 1940
inspiraram grande parte da sua obra. A
convicção de que a arte, quanto mais
local é, mais universal é,
acompanhou-o. No início deste século,
doou toda a sua coleção de arte à
Colômbia, uma decisão que veio a
considerar a mais importante e
satisfatória da sua vida. Para além das
obras expostas nos museus de Bogotá e
Medellín, outra das suas esculturas é
talvez o maior testemunho da
transformação desta última, a capital
da província de Antioquia, e do terror
que sofreu durante o narco-terrorismo
do final do século passado. Quando uma
bomba destruiu a pomba com a sua
assinatura que estava exposta numa
praça da cidade, causando 26 mortos e
uma centena de feridos, Botero pediu
que não fosse reconstruída. Deixou-a
como monumento desfigurado e, ao lado,
fez outra pomba em homenagem à paz.
Ainda hoje é assim. A guerra e a paz da
Colômbia através do seu artista mais
universal.
- Ano V • novembro 2023