Contemplações
Francisco Gil
A beleza da Arte e a Arte sem beleza
- Partilhar 11/06/2019
Obras que se auto destroem ou que foram
criadas para serem destruídas,
instalações ou exposições de obras com
discutível valor estético. Parece que
este passou a ser o novo paradigma das
artes visuais nos últimos anos. É certo
que na antiguidade o conceito de arte
era substancialmente diferente. Arte,
para os antigos, dizia respeito às
atividades dos nobres, sobretudo à
atividade intelectual. Com a
modernidade, iniciada com a chamada
revolução industrial, o conceito
alargou-se e começou a incorporar não
só os valores estéticos, mas também
outros valores, como os de mercado.
O conceito de beleza e de obra de
arte, amplamente difundido em
praticamente todos os manuais
escolares, que repetem ano após ano as
mesmas imagens, dão-nos a ilusão que a
arte e os valores estéticos das suas
obras se situam inevitavelmente entre
Leonardo da Vinci e Salvador Dalí. Isto
é, a Arte para a cultura ocidental tem
sido sobretudo a produção de objetos
para serem admirados e o próprio ato de
contemplação.
O urinol de
Duchamp, exposto hoje na Tate Modern em
Londres – uma réplica de 1964 de um
original comprado pelo artista numa
loja de material de construção em 1917
e enviado para uma exposição em Nova
Iorque que o rejeitou – marca, talvez,
o início do conceito de que é mais
importante a ideia da obra do que o
labor do artista na sua criação. O
próprio Platão, há mais de 2300 anos,
também considerava que pintores e
escultores se limitavam a copiar a
natureza. A natureza, ela sim – para
Platão – é a verdadeira obra, o
resultado do ato sublime dos deuses que
a idealizaram.
Quando
recentemente uma obra de Banksy se auto
destrói após ser leiloada, o que nos
quer dizer? Uma ação de marketing
devidamente orquestrada? A contestação
aos princípios do mercado? A
valorização da ideia em oposição à
contemplação do objeto? Certo é que as
vanguardas artísticas cada vez mais se
afastam dos conceitos de arte, quer
como objetos ditos “belos” para serem
contemplados, quer como de objetos
ditos “valiosos” para serem vendidos e
comprados.
Hoje, cada vez mais,
Arte é forma de expressão e como forma
de expressão a Arte é comunicação e é
tudo. Se no século XIX expropriaram e
retiraram obras das igrejas e palácios
para os museus, se no século XX se
começaram a produzir obras para
galerias comerciais, parece que todo
esse paradigma se reconstrói, sem
limites. Provavelmente hoje, as
manifestações artísticas são uma
habilidade, um jeito de comunicar, de
contestar e, sobretudo, uma forma de
alimentar os egos nesta sociedade
consumista.
- n.1 • junho 2019