Poemas ibéricos
Santiago Aguaded Landero
Poemas ibéricos (21) BEATRIZ RUSSO
Beatriz Russo (Madrid, 1971) é licenciada em Filologia Hispânica (linguística) e um mestrado em ELE (ensino do espanhol como língua estrangeira). É poeta e romancista. Uma vez que viveu um confinamento de vários anos, e descobriu que para ser poeta não é preciso morrer. Há mais de duas décadas que participa em eventos literários nacionais e internacionais em universidades em Espanha, Europa e América Latina, em várias sedes do Instituto Cervantes e em festivais internacionais de poesia (Morelia, México, D.F.). (Morelia, Cidade do México, Toluca, Lima, Santiago do Chile e Costa Rica). Em 2004 publicou a sua primeira colecção de poemas, En la salud y en la enfermedad, dos quais não cessou os seus esforços para encontrar a sua própria voz, que encontrou em La prisión delicada (Calambur, 2007). Publicou os livros de poesia En la salud y en la enfermedad (Sial, 2004), La prisión delicada (Calambur, 2007), Aprendizaje (Polibea), 2010), Universos paralelos (EEC, 2010), Los huecos de la lluvia (Universidad de Costa Rica, 2010), Node Costa Rica, 2010), Nocturno insecto (Tigres de Papel, 2014), Perfil anónimo (Perfil anónimo) (Exemplar Único, 2017) e Naobá y los pájaros (La hoja de Baobab, 2018), La memoria de los grillos (Municipalidad de Lima, 2020), La llama inversa (Huerga & Fierro, 2020), e o romance Bruna (Lince, 2021). O seu trabalho aparece em várias antologias e em numerosas revistas literárias, tanto em papel como online. Vive actualmente em Málaga e é escritora de guião e consultora literária na produtora Kandale Films.
MORAR EN LA EDAD DE LOS INCENDIOS y resistir en este páramo infestado de reptiles ajenos a la humedad. Todo lo que una vez tuve se desvanece sin testimonio. Las brasas cumplen su función colateral. Ni el viento que a veces retorna logra prender la llama que ahora invoco. Tocar la otra piel con la incandescencia del deseo, traspasar la pátina que cubre el oro de los cuerpos y acoplar los perfiles en comunión mutante sobre su altar. Guiarse a través del aliento y galopar sobre el delirio mientras ocurre el milagro de la impregnación. Ser y estar en cada víscera y avivarlas tras el beso. Sentir la destilación hepática de la sangre pulsada, la savia temprana rehabilitando cada hueso, y articular las vértebras, las palabras, hasta desprenderse de la carne que convierte en cenizas todo fuego provocado.
***
MORAR
NA IDADE DOS INCÊNDIOS e
resistir neste deserto infestado
de répteis alheios à humidade.
Tudo o que em tempos tive
desvanece sem testemunho. As
brasas cumprem a sua função
colateral. Nem o vento que por
vezes regressa consegue apanhar
a chama que agora invoco. Tocar
a outra pele com a
incandescência do desejo,
perfurar a pátine que cobre o
ouro dos corpos e colar os
perfis em mutante comunhão no
seu altar. Guiar-se através do
fôlego e galopar sobre o delírio
enquanto acontece o milagre da
impregnação. Ser e estar em cada
víscera e avivá-las após o
beijo. Sentir a destilação
hepática do sangue latejante, a
seiva temporã reabilitando cada
osso, e articular as vértebras,
as palavras, até descolar-se da
carne que torna em cinzas todo o
fogo provocado.
Do livro La
llama inversa (2020)
Editorial Huerga & Fierro
BAJO LA CAPA
AZUL DE LÊDO IVO
Morar bajo
la misma capa azul que construyó
el hogar de Lêdo Ivo.
Arrastrarse en la itinerancia
del pasado como un perro
callejero cargando el ladrido en
la hojalata de su pata trasera.
El rumor de la lluvia al
caer no cambia de idioma, pese a
algún pseudónimo que aspira a
colarse en la memoria del
viajero melancólico.
Así la
nomenclatura del poema habla del
mismo amor, la soledad misma, la
misma muerte.
Una radio de
pilas rescata la infancia toda
en mi casa y en Brasil, idéntica
exaltación de la maravilla que
exhala v oces invisibles.
Lêdo Ivo es una cajita de música
que vibra en sus poemas.
Las
púas del peine mesan el lamento
solitario, diluyendo ortigas en
un nido de gorriones.
Suyo
es su trino primigenio, del
universo es la versión de quien
lo vuelve a pronunciar.
Algo
queda tras la ausencia de cada
hombre;
el sueño de los
peces, las cabriolas de un
papagayo, dientes de un mar que
muerde…
O aquel desayuno
compartido en Morelia buscándole
un nombre a la sospecha que
habría de cumplirse unos meses
después.
Él me dijo Morelia,
pero fue varón.
Conversar
sobre la no existencia significa
alegría cuando hay porvenir.
Hablar de la no existencia tras
la huella insuficiente se
convierte en trámite y
resignación.
Así el poeta nos
dejó teclas de piano en los
bolsillos para espantar a los
cuervos del silencio en la noche
helada que se acaba.
(inédito,
noviembre, 2021)
***
SOB O MANTO AZUL DO
LÊDO IVO
Morar sob o mesmo manto azul
que construiu o lar de Lêdo Ivo.
Arrastar-se pela itinerância do
passado tal como um cão
calcorreador de ruas levando o
latido na lata da sua pata
traseira.
O ruívo da chuva
não muda de idioma quando cai,
apesar de algum pseudónimo que
anseia colar-se à memória do
melancólico viandante.
De
igual modo a nomenclatura do
poema fala do mesmo, da mesma
solidão, da mesma morte.
Um
rádio de pilhas resgata toda a
infância na minha casa e no
Brasil, idêntica exaltação, da
maravilha exalando vozes
invisíveis.
Lêdo Ivo numa
caixinha de música que treme nos
seus poemas.
Os dentes do
pente puxam o solitário lamento,
diluindo urtigas num ninho de
pardais.
Seu é o primogénito
trinado, do universo é a versão
de quem o queira pronunciar.
Algo fica depois da ausência
de cada homem;
o sonho dos
peixes, os saltos de um
papagaio, dentes de um mar que
morde...
Ou aquele
pequeno-almoço partilhado em
Morelia procurando-lhe um nome à
suspeita que uns meses depois se
haveria de cumprir.
Ele
disse-me Morelia, mas foi varão.
Conversar sobre a não
existência significa alegria
quando há porvir.
Falar da
não existência depois da
insuficiente peugada torna-se em
trâmite e resignação.
Por
isso nos deixou o poeta teclas
de piano nas algibeiras para
afugentar os corvos do silêncio
na noite (re)gelada que termina.
Tradução de
Manuel Neto dos Santos,
Novembro 21
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poemas em
Poemas ibéricos nº 16
- n.31 • dezembro 2021