Crónica
Fernando Correia
A MANIA DAS GRANDEZAS
- Partilhar 27/01/2023
A Jornada Mundial da
Juventude vai trazer a Portugal o Papa
Francisco, enquanto representante máximo da
igreja Católica e enquanto símbolo do
sofrimento de Jesus Cristo, dito filho de
Deus, na sua passagem mensageira e
transformadora pela Terra, e vai trazer
também milhares de jovens, muitos deles
acompanhados pelos seus familiares, que
comungam dos mesmos ideais de paz,
concórdia, amor pelo próximo e crescimento
espiritual.
Serão jornadas de fé e de
manifestação da unicidade de Deus com os
Seres Humanos, percebendo-se ser uma
ocasião abençoada para se preparar o Mundo
para um futuro melhor, mais digno e de maior
transparência.
Francisco já manifestou,
por diversas vezes, a sua identificação com
os mais pobres, com os desprotegidos pela
sociedade, com os marginalizados, com os que
sofrem por estarem sós, por não terem
trabalho, por não terem casa, por não terem
quem olhe por eles e para eles.
Para além
dessas manifestações e do seu interesse em
querer uma vida pessoal afastada de riquezas
e de pompas, afinal mais de acordo com a
religião Católica e com a palavra de Jesus,
Francisco pôs de parte a ostentação do
Vaticano, desde a sua morada às suas vestes,
até à forma como se faz transportar e às
mensagens que a sua voz irradia, sempre em
favor dos mais desfavorecidos.
É nessa
zona da sociedade civil que ele se sente bem
e é por esse tipo de sofrimento que mais
deseja espalhar a sua palavra e nas
encíclicas a que dá visibilidade exterior,
existem sempre sinais de humildade e de
aperfeiçoamento interior.
Por esta
razões, não pode estar feliz ao saber que só
o palco-altar a construir para a Jornada
Mundial da Juventude, onde ele será o
personagem principal, vai custar cinco
milhões de euros (fora o resto) ao erário
público português, acrescentando ainda os
custos inerentes à sua deslocação, à sua
permanência e às suas outras visitas
programadas. A estimativa das despesas
relativas à deslocação papal e de tudo o que
a envolve anda pelos 160 milhões de euros.
Curiosamente, ou não, porque nada acontece
por acaso, Deus transmitiu um aviso a
Portugal, deixando-o ao frio do Inverno e
Lisboa (temperada por natureza) a viver uma
experiência gelada, sobretudo para os sem-abrigo da cidade que ganharam a bondade
temporária do Município (o dos 5 milhões
para o palco-altar) ao mandar abrir,
durante a noite, algumas estações de metro
para eles pernoitarem e facultando-lhes,
até, a utilização de um pavilhão desportivo,
contendo algumas dezenas de camas, a fim de
os albergar por uns dias.
Quando o frio
abrandar, fecha-se o Pavilhão Desportivo e
as estações de metro encerram as suas
portas.
Neste momento e por tal razão
estará o Papa Francisco a pensar o mesmo que
muitos de nós: os cinco milhões de euros
(fora o resto, num total de 160 milhões)
davam e sobravam para construir
infraestruturas destinadas a albergar os sem-abrigo da cidade, em zonas devolutas ou
expectantes de Lisboa, suficientes para
diminuir a desgraça em que caíram pelas mais
diversas razões.
E dava para comprar
camas funcionais, almofadas, lençóis e
cobertores. Não daria a bondade social para
lhes enxugar as lágrimas, mas certamente
iriam sentir que alguém se preocupava com
eles.
E o Papa Francisco ficaria feliz a
abençoar os jovens que virão de várias
partes do Mundo, num palco-altar, mesmo
raso ao chão, com flores portugueses ao seu
redor, que custasse o preço da dignidade e
do bom senso.
Jesus foi pregado numa Cruz
e deu ao Mundo o exemplo do seu sofrimento.
Como que criou um palco natural do tamanho
do Universo para albergar a fé dos Homens.
FERNANDO CORREIA
(Jornalista e Escritor)
- n.45 • fevereiro 2023