Crónica
Fernando Correia
Roubar para não ter fome
- Partilhar 25/10/2022
Os supermercados
estão a colocar alarmes nalguns produtos
alimentares que são, ao que dizem,
facilmente subtraídos às caixas de
pagamento.
Conservas, congelados,
queijos, manteiga, leite e por aí adiante,
desde que facilmente manobráveis, são
produtos que têm sidos desviados por gente
com fome, por pessoas no limiar da pobreza,
ou por mães que não têm nada para os filhos
comerem e que já os mandam à Escola mais
para eles comerem uma refeição quente por
dia, do que para aprender as letras e as
contas.
É um Portugal triste este em
que vivemos.
É um lugar disfarçado de País,
com ricos e pobres, portanto sem a produtiva
classe média que faz avançar a economia.
É um pedaço da União Europeia sem bases de
sustentação para resistir ao efeito
“boomerang” das sanções impostas aos que
fazem a guerra.
Os ricos “enchem–se” com os fundos europeus (está na moda),
com desvios, espertezas, subtilezas,
dinheiro empresta(da)do pelos bancos,
negócios de exploração do próximo ou do
desprevenido, compadrios familiares e
empregos partidários.
A classe média vive
uma pobreza envergonhada, fazendo números
constantes de equilibrismo para resistir às
exigências dos trinta dias do mês.
Os
pobres pedem dinheiro nas ruas, acorrem às
ajudas alimentares das organizações que
existem para o efeito, dormem ao relento e,
algumas vezes, recorrem aos supermercados
para disfarçar a fome.
E nós? Os que
somos apenas números? Os que não importamos?
Disfarçamos. Sofremos. Escondemos.
Resistimos.
Quando eu tiver fome e
roubar para comer, só consinto em ser preso
se os outros que roubam de barriga cheia
forem presos também.
FERNANDO CORREIA
(Jornalista e Escritor)
- n.42 • novembro 2022