Fernando Correia

Crónica

Fernando Correia

PERDI MAIS UMA FEIRA
NA FEIRA DA MINHA VIDA

O Presidente da Câmara Municipal, Carlos Moedas, anunciou a desistência de Lisboa do projecto da Feira Popular, em Carnide.

Segundo ele (e só ele) é uma desistência por falta de investidores e porque hoje em dia já não há quem procure este tipo de equipamento, como acontecia na nossa juventude (estou a falar de nós, os mais velhos), elevando – nos ao plano da escolha da diversão, da brincadeira graúda, do petisco ocasional, da fartura, do algodão doce, do carrossel, do comboio fantasma, da grande roda, do poço da morte e do jogo dos espelhos que nos fazia mais gordos ou mais magros, consoante o formato, fazendo – nos rir que é algo de muito saudável que hoje é quase proibido fazer.

Estamos em tempo de guerra, de carestia de vida, de inflação galopante, de desemprego, de greves, de fome, de desespero para conseguir sobreviver, juntamente com o nosso agregado familiar.

Mal seria que tentássemos ultrapassar, nem que fosse por uma tarde ou por uma noite, esse desespero, com uma ida à Feira Popular de Lisboa a troco de um bilhete de ingresso simbólico, ou de uma bifana e um copo de cerveja, embrulhados em luzes e cobertos pelo único som que nos protege as dívidas: o som da vida!

Para além disso havia emprego e trabalho para muita gente e havia os carrinhos de choque, talvez o circo de feira e o comboio fantasma, e uma mulher para ler a sina.
Havia restaurantes e artesanato, exposições, vendas solidárias e livros…
Também havia o lago, o comboio, a montanha russa (ou ucraniana), o passeio de charrete e a imaginação…
Ah! A imaginação!...
Mas imaginação sem investidor, não é possível, porque na actual Câmara de Lisboa não há quem imagine!
O Presidente não quer.
O Presidente nunca foi criança.
O Presidente nunca teve um balão.
O Presidente de feiras só conhece a “Ovibeja”.
O Presidente não avalia a dimensão e a importância do investimento popular, nem sabe rir de olhos arregalados para a primeira surpresa da infância das descobertas.

O Presidente já nasceu apreensivo e tantas contas fez que lhe falharam as contas da alma, porque não havia investidor para elas.

Estou triste e ofendido.
Triste, por mim, pelos meus filhos, pelos meus netos, pelas crianças da minha cidade.
Ofendido, porque me andam a esconder a verdade e me relegam para uma posição de subalternidade intelectual que não mereço, enquanto homem livre e cidadão de Lisboa.

FERNANDO CORREIA
(Jornalista e Escritor)