Daniela Graça

Espelho Cinemático

Daniela Graça

A Vida Extraordinária de Louis Wain

A Vida Extraordinária de Louis Wain estreou nas salas de cinema portuguesas a 20 de janeiro. Este filme biográfico, da autoria do realizador Will Sharpe, é protagonizado pelo ator Benedict Cumberbatch que encarna o enigmático artista britânico que encantou o mundo com as suas pinturas de gatos caracterizadas por um estilo único reconhecível (e imitado) até à nossa atualidade. Esta produção britânica traz ao grande ecrã a vida e obra de Louis Wain, seguindo as suas peripécias desde a década final de 1800 até 1930.

Inicialmente, a personagem de Louis Wain enquadra-se perfeitamente no arquétipo de génio excêntrico, estranho e com pouca aptidão social. Arquétipo este pelo qual o ator Benedict Cumberbatch é conhecido (Sherlock na série homónima da BBC, Alan em The Imitation Game, Doctor Strange no universo cinemático da Marvel). Conhecemos Wain num frenesim, sempre em movimento, dedicado a todas as suas paixões em simultâneo, desde composição de óperas às suas patentes, porém não tem sucesso nessas experiências. Sendo um pintor talentoso, Wain encontra nas ilustrações para o jornal a forma para providenciar para as irmãs mais novas e mãe, visto que era a sua responsabilidade enquanto chefe de família. Wain é audaz, frenético e completamente obcecado pela ideia de “eletricidade”, a ideia de energia como força omnipresente e capaz de solucionar todos os males.   

A criatividade e necessidade de desvendar a misteriosa “eletricidade” parte não só da curiosidade inerente ao jovem artista, mas também de uma dor profunda, que assume forma em pesadelos e neuroses presentes desde criança. Como se tornam então os gatos o objeto de interesse nas pinturas de Wain, um artista torturado e brilhante? A resposta é simples: devido à sua esposa, Emily Richardson (Claire Foy). Pouco tempo depois de se casarem, Emily é diagnosticada com cancro. É nessa altura que o casal encontra um gato bebé e adota-o como animal de estimação, algo incompreensível para a altura, e Louis começa a desenhar o gatinho, Peter, para Emily. Incentivado pela esposa, Louis mostra os desenhos dos gatos ao editor do jornal e estes são publicados.

As ilustrações de Louis são uma revolução artística e social, tornaram-se extramente populares rapidamente e mudaram a opinião pública sobre gatos, outrora olhados com desconfiança foram agora elevados a animais de estimação adoráveis. Este sucesso deve-se, tal como a esposa e amigos próximos de Wain afirmam, ao facto de o pintor ser o primeiro a entender a natureza dos gatos (forasteiros; ridículos, mas ternurentos; assustadiços, mas corajosos) e expressá-la com esse leque de facetas, em parte por ele próprio partilhar essas mesmas características.

Mesmo depois da dor descomunal que foi perder Emily, depois da queda da popularidade das suas ilustrações e do seu estatuto social e económico, Louis continuou a desenhar gatos até ao fim e a sua fixação na “eletricidade” apenas aumentou. A evolução na sua arte demonstra esse mesmo declínio mental e emocional, chegando a ter traços psicadélicos.

O mais louvável em A Extraordinária Vida de Louis Wain é a dedicação em contar visualmente a história no estilo artístico que reflete o artista e a sua época. Os exemplos são vários desde pesadelos filmados de forma a lembrar os filmes do início do séc. XX tingidos em azul a sequências psicadélicas perto do internamento de Wain. Mas, o mais admirável são os planos que se transformam ao ponto de se assemelharem a quadros autênticos com pinceladas, por meio de efeitos visuais, desfoque, tonalidade e vivacidade da luz e das cores na paisagem, capturando e imortalizando a “eletricidade” a que Louis se refere quando estava na presença de Emily, aquela energia única, a conexão e amor sentidos naqueles momentos, o pontífice do belo capaz de solucionar tudo.

A Extraordinária Vida de Louis Wain é um filme em termos estilísticos maximalista, decidido a reproduzir o sentimento da obra e carácter do pintor, que pela maior parte mantém uma narrativa coesa e interessante, balançando o eufórico e disfórico da vida elétrica de Wain.

Classificação: ★★★★