Francisco Gil

Contemplações

Francisco Gil

Movimento da Arte Metafísica:

Representação de imagens que vão além da realidade física

A Arte Metafísica nasce oficialmente do encontro fortuito entre o pintor Giorgio De Chirico e o antigo pintor futurista Carlo Carrà, em 1917, no hospital militar de Ferrara, onde ambos se encontravam internados durante a Primeira Guerra Mundial. Os dois artistas já trabalhavam há algum tempo num novo estilo de pintura, que superaria o movimento anterior do Futurismo, opondo o dinamismo futurista a obras realistas e estáticas, e a sua ânsia vanguardista a temas de inspiração clássica. Carrà, depois da experiência futurista na sua obra anterior, aproxima-se da pintura divisionista e, em 1917, explora o campo do primitivismo. De Chirico e o seu irmão mais novo Alberto Savinio, antes de 1917, já teorizavam os aspetos fundamentais da pintura metafísica.

A génese da Arte Metafísica deve-se, de facto, a um escrito de De Chirico em 1912, durante a sua estadia em Paris. O pintor descrevia um dos seus quadros de 1910, O Enigma de uma Tarde de Outono, exposto no Salon d'Automne. De Chirico conta a inspiração que o levou a essa obra de arte; um momento de revelação que ocorreu na Piazza Santa Croce, em Florença, no qual o artista percebeu expressamente o enigma da natureza e a estranha impressão da praça silenciosa e deserta. Este sentimento de revelação e mistério permanece presente em toda a obra posterior de De Chirico. Em 1914, também Carlo Carrà e os escritores e poetas Ardengo Soffici e Giovanni Papini chegam a Paris. Nessa altura, conheceram De Chirico e Savinio. No entanto, com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, os artistas tiveram de se alistar no exército.

Foi necessário esperar pelo encontro de De Chirico e Carrà para iniciar oficialmente o movimento. Após o encontro, Carrà expõe na Galeria Paolo Chini de Milão uma exposição pessoal dos seus trabalhos, na qual se encontram obras fortemente inspiradas no estilo metafísico. Giorgio De Chirico, praticamente desconhecido na época, teve de esperar até 1919, quando expôs pela primeira vez em Itália os seus quadros na Galleria Anton Giulio Bragaglia, em Roma. A disputa entre Carrà e De Chirico sobre a invenção da Arte Metafísica foi muito acesa na altura. Até hoje, estudos consideram De Chirico como o maior expoente do movimento.

Características da pintura metafísica: A Arte Metafísica caracteriza-se pelo extremo realismo e precisão de execução e, ao mesmo tempo, por uma atmosfera que vai além da realidade. É isto que confere a qualidade misteriosa das pinturas metafísicas. São "paisagens do espírito".

Existem alguns dispositivos pictóricos típicos das pinturas de De Chirico, tais como contrastes anormalmente acentuados, espaço perspectivo profundo e céu de tons escuros. Contribuem também para a sensação de enigma os títulos que o pintor escolhe para as suas obras, como Enigma de uma tarde de Outono, Conquista do Filósofo, Recompensa do Adivinho ou o quadro Melancolia de Turim.

Os elementos iconográficos recorrentes nas pinturas metafísicas são as praças desertas das cidades italianas, a utilização de manequins, estátuas gregas e outros elementos mitológicos e clássicos, estruturas arquitectónicas com arcos, que suscitam uma sensação de solidão e de deslocação.

No entanto, diferentes pintores metafísicos declinaram o estilo com ênfases diferentes. De Chirico procurou o enigma, justapondo objectos e utilizando, segundo a historiadora de arte Jennifer Mundy, um grande sentido de ironia e de brincadeira. O tema do fantástico, do jogo, do imaginário está muito presente nas composições do seu irmão Savinio. Carrà foi atraído pela Arte Metafísica sobretudo pela procura de valores formais puros, sem descritivismo profundo. Para Giorgio Morandi, o estilo metafísico era uma forma de purificar o assunto, concentrando-se no significado dos objectos.

O legado da arte metafísica: A pintura metafísica influenciou o movimento artístico do Surrealismo, pela afinidade de temas e ideias e intenções artísticas semelhantes. Em particular, as composições de Max Ernst foram largamente influenciadas pela escola metafísica. Foi também uma grande influência para René Magritte, Salvador Dalì e o teórico da vanguarda francesa André Breton. Em termos de referências, os pintores metafísicos inspiraram também, nos anos 20, as pinturas alemãs de George Grosz e Oscar Schlemmer, que utilizaram a estética icónica dos manequins. As pinturas de De Chirico, pelo seu mistério vagamente ameaçador, também influenciaram mais tarde o estilo do pintor italiano Felice Casorati. (adaptação de texto de Cinzia Franceschini).