Francisco Gil

Contemplações

Francisco Gil

As Obras de Arte do Google

Levei algum tempo a pensar qual o tema que deveria abordar nesta minha rubrica. Veio à ideia o tema Obra de Arte, que é recorrente, mas tem sempre muito pano para mangas. Então decidi fazer uma pesquisa simples no poderoso motor de busca da Google, cuja palavra chave seria «obra de arte». Tinha curiosidade em saber o que me indicariam. Na categoria de imagens, surge em primeiro plano uma série de anúncios publicitários e de seguida um conjunto de imagens que pressupomos serem aquelas «obras de arte» mais valiosas para a comunidade virtual do ciberespaço. Provavelmente não deverão ser. O conjunto de imagens apresentado pelo Google é resultado de um sofisticado algoritmo, que deverá ter muitos procedimentos precisos que não passarão pela cabeça da maioria dos usuários da rede. Ficaremos sempre na dúvida se serão essas imagens as de maior impacto das artes visuais e indicado-nos os principais exemplos da arte ocidental.

Então o que temos? Uma, a primeira: «A noite estrelada» de van Gogh; quatro imagens de «Mona Lisa» de Leonardo; «A rapariga com brinco de pérola» de Vermeer; «A persistência da memória» de Dali; duas imagens de «O grito» de Munch; duas imagens de «Abaporu» da artista brasileira Tarsila do Amaral; e «O nascimento de Vénus» de Botticelli. Estas, no meu computador, serão as Obras de Arte de referência. Claro. E a acrescentar a tudo isto, o facto de eu estar aqui a apresentá-las, estou ainda a reforçar esta lista que o Google me apresenta. Mas estas serão mesmo as obras de arte de referência? As mais belas e valiosas?

Já sabemos que Arte é a expressão de ideais estéticos por meio de algumas atividades humanas. A questão que se pode colocar, é se o que considera ideais estéticos poderá estar, ou não, condicionado por princípios subjetivos que são promovidos pela cultura e pelo poder dominante. Pessoalmente, os exemplos promovidos pelo Google são, para mim e para muitos de nós, bons exemplos e representam algumas grandes obras da pintura universal. O problema destes algoritmos que valorizam aquilo que é muito procurado, é que aumenta de forma desproporcional o fosso entre as obras mais conhecidas em relação às menos conhecidas, ficando as muito conhecidas mais conhecidas ainda e as menos conhecidas, esquecidas e ignoradas.

Ser mais ou menos famoso, para o algoritmo do Google não tem qualquer relação com critérios de qualidade, originalidade ou outros. O Google funciona com quantidades. Uma obra passa a estar no topo da lista se for muito falada e procurada. É um critério irrelevante para os artistas e autores das obras em questão – já cá não estão no reino dos vivos – mas provavelmente ajudarão a dar mais visibilidade aos museus e centros de arte proprietários das famosas Obras de Arte. Só o MoMA (Museu de Arte Moderna de Nova Iorque) tem duas das obras supramencionadas em exposição. Arte é muito mais que obras famosas, é muito mais do que aquilo que repetidamente nos andam sempre as mostrar.