António Grosso Correia

IN VERBIS

António Grosso Correia

DESABAFO

Cada vez mais se fala de corrupção e de compadrio, no nosso País.
O corrupto perdeu a vergonha e o respeito, até por si próprio!
Como se sabe, tais actos são sempre inadmissíveis e gravemente lesivos, quer da dignidade que os órgãos onde eles ocorrem não podem deixar de ter – para merecerem os necessários e indispensáveis respeito e confiança dos administrados, isto é, de todos os cidadãos – quer pelo prejuízo que deles decorre para a economia nacional, quer pelas injustiças e desequilíbrios sociais que provocam, quer pela vergonhosa imagem que veiculam do País e de todos nós.
Ora, conquanto tais actos sejam intoleráveis e ilícitos – a corrupção constitui crime e o compadrio, ainda que, em princípio, o não constitua (sê-lo-á se integrar ou em associação com uma conduta de funcionário conducente à obtenção de uma vantagem, patrimonial ou não patrimonial, que não seja devida) não deixa, por isso, de ser socialmente censurável – a verdade é que, embora muitas vezes se saiba que aqueles actos existem e quem são os seus agentes, na maioria dos casos é muito difícil provar a sua existência.
Aqui está, com efeito, o primeiro grande escudo dos corruptos; outro é o indecente abrigo que os partidos políticos (como diz o povo, quem não quer ser lobo não lhe vista a pele) vão concedendo, quando o corrupto é um dos seus membros. Que importa que seja corrupto, se ganha eleições e até dá “algum” para o partido? Eis a ignóbil cultura instalada. Depois, apelam freneticamente ao Zé povinho para que vote (pudera!); finalmente, o outro escudo é a inaceitável falta de meios, materiais e humanos, com que o poder judicial se defronta.
E se tais criminosos forem titulares, eleitos, de órgãos de soberania – em que o crime é muitíssimo mais censurável e grave – cabe aos cidadãos eleitores penalizá-los nas urnas, atenta também, mas não só, aquela dificuldade de prova, enquanto tais delinquentes não caírem nas malhas da justiça, o que, apesar da referida escassez de meios, bem pode acontecer mais cedo do que estão a admitir, pelo à-vontade com que se mexem nas catedrais daquele lamaçal e da prática de certos comportamentos, como as grandes e chorudas, quanto ilícitas, negociatas, ainda que, por razões óbvias, por interposta pessoa.
Tal penalização, mais do que um direito dos cidadãos, é um dever que se lhes impõe, a todos.
Por isso, por bem e para bem de todos, devemos aproveitar todos os actos eleitorais para mostrarmos que, ao contrário do que por aí já se vai ouvindo, o povo não está, afinal, tão amorfo e resignado com esta chaga nacional.
Não votar nos corruptos é, pois e antes do mais, um acto patriótico. E um dever ético. Como bem se depreende, não deixo de temer, como modesto oficial do direito e amante da justiça, mas sobretudo como cidadão, que os meus compatriotas não valorem bem a gravidade de tais crimes e comportamentos, bem como os seus nocivos efeitos, dos quais acima cito alguns. É que se assim for, a perda e os prejuízos são de toda a Nação; não apenas de alguns dos seus membros. E serão seguramente irreparáveis.
Atente-se no que se passa na América latina, com destaque para o Brasil, onde o dinheiro tudo compra, numa perfeita e completa subalternização do próprio homem, por isso que aí se encontrando apenas e inevitavelmente duas classes sociais: de um lado, a da mais deprimente e desumana miséria, que abrange a grande maioria da população; do outro, a abastança opulente e ultrajante de uma minoria corrupta, arrogante e desavergonhada. Daí a injustiça. Daí a grande criminalidade.
Estou certo de que nenhum de nós desejará isto para o nosso País, mais que não seja pelos nossos filhos...

António Grosso Correia (Desrespeitador compulsivo do acordo ortográfico)