Vaguear na Maionese
Paulo Falcão Alves
OS NOVOS HIPER INCLUÍDOS
Em 2004 Castells
definia o termo info-exclusão como a
incapacidade dos indivíduos em acederem à
tecnologia. Para o autor este fenómeno
poderia vir a ser responsável pela criação
de um «quarto
mundo»,
um mundo formado por aqueles que têm
possibilidades de viajar e adquirir
conhecimentos e por aqueles que não o podem
fazer, aumentando assim as desigualdades
entre os que têm e os que não têm acesso à
informação.
Entretanto, com o
avanço tecnológico da última década, a
realidade de Castells já não se pode resumir
ao não acesso à tecnologia. Basta olhar para
os populares que se aglomeram nos centros
comerciais às portas das grandes operadoras
de telecomunicações na esperança de verem o
seu “pesadelo” resolvido em troca de mais um
ano de fidelização.
Famílias
completamente alheias às estratégias e
planos maquiavélicos de uma
superestrutura
cujo principal objetivo continua a ser o de
extorquir ao máximo o último tostão de um
proletariat
imerso numa amálgama de entretenimento
anárquico e brejeiro, cada vez mais alienado
do mundo que o rodeia, impotente para
alterar a sua situação de carência social.
Depois, como do
nada, surge um vídeo de violência policial
ou de maus tratos a animais e lá sai o povo
à rua para protestar, pilhar ou derrubar
estátuas – gritos de desespero de uma “vida
sem sal” imortalizados em
smart mobs
como se de um último suspiro se tratasse.
Gritos de revolta
de quem já pouco espera de uma sociedade que
nada mais tem para lhes dar a não ser
pistachio
para conversas de café – uma sociedade
privada de sonhos e projetos de vida,
desvairada pela inovação tecnológica
tentando desmerecer a visão de um futuro
inóspito e miserável – um «quarto
mundo» formado
por não pela incapacidade de acesso à
tecnologia, mas antes no seu oposto – os novos
híper incluídos.
- n.15 • agosto 2020