Contemplações
Francisco Gil
Uma cena na praia
John French Sloan
foi um pintor que se destacou a representar
a Nova Iorque de inícios do século XX.
Nascido e criado na Pensilvânia, EUA, onde
incentivado pela família estudou desenho e
pintura, desenvolveu com outros companheiros
um estilo neorrealista que marcou a arte
norte americana onde se destacam pinturas
representando a vida cosmopolita daquela que
mais tarde viria a ficar conhecida como a
Big Apple.
O seu trabalho em
Nova Iorque começou em 1904, tinha 33 anos.
Observava e representava a cidade numa
perspetiva realista, destacando quadros do
dia-a-dia nova iorquino. O importante eram
as pessoas e de como interagiram nos espaços
públicos. Nas suas obras destacam-se cenas
da rua, restaurantes, salões de beleza,
pátios, etc. capturando e interpretando a
essência da vida dos bairros de Nova Iorque.
South Beach é um
bairro de Nova Iorque, situado na costa
leste de Staten Island. Possui uma praia com
o mesmo nome. Quando Sloan a visitou pela
primeira vez em 1907 sabia que a mesma era
frequentada sobretudo por pessoas da classe
trabalhadora e não perdeu a oportunidade de
a retratar, no seu ambiente humano tão
característico.
A sua obra
South Beach Bathers
(1908), representa
uma tarde na praia passada por pessoas
comuns: uma mulher em pé ajeita o cabelo no
chapéu enquanto interage com um grupo de
amigos num piquenique algo incomum, ao jeito
de
Le déjeuner sur l'herbe (Manet,
1863). Incomum porque no grupo de banhistas
devidamente equipados com os fatos de banho
da época, está um homem vestido como um
executivo saído do
escritório com um caranguejo na mão. É um
piquenique de cachorros quentes e
caranguejos pousados num pequeno lenço
estendido na areia. Não há talheres, não há
bebidas, é um piquenique bem estranho que
nos leva a pensar no ridículo da situação.
Ao contrário da
famosa
obra de
Manet
que pretendeu escandalizar a sociedade
conservadora parisiense de finais do século
XIX, esta obra de Sloan pela situação
ridícula representada, mostra-nos, talvez,
aquele que foi o piquenique mais exótico de
South Beach com caranguejo e cachorro
quente, numa amena tarde de verão.
A pintura, como a fotografia ou o cinema, permite montar quadros e cenas ao detalhe que são uma perfeita mentira, mas tão próximas da realidade que facilmente as aceitamos como verdadeiras. E o inverso também é real. Quando hoje vamos a uma praia e encontramos um grupo de amigos, uma família, usando máscaras cirúrgicas, diríamos mesmo que estamos diante de uma cena neorrealista, só imaginável na mente de um artista. Daí a beleza da arte: uma interpretação da realidade, uma mentira que é real.
* South Beach Bathers , [ John French Sloan ], 1907-1908, óleo sobre tela, 66,04 x 80,65 cm - Walker Art Center, Minneapolis, EUA
- n.15 • agosto 2020