IN VERBIS
António Grosso Correia
COMO PODE ALGUÉM CONTINUAR A DEFENDER A GUERRA!...
No tempo que já levo
de vida, não me lembro de alguma vez não
existir guerra ou ataques terroristas em
qualquer parte do mundo.
Invariavelmente,
quando aquela ou estes ocorrem, a discussão
coloca-se espontaneamente no modo de os
combater: uns defendem que eles se combatem
com diálogo; outros, como, por exemplo, os
defensores da política internacional dos
Estados Unidos, opinam que é com guerra
(provavelmente com invasões de países, mais
mortandade de pessoas inocentes e indefesas,
a latere
do direito, como a história nos tem vindo a
mostrar).
Pois bem, no meu
modesto juízo, nem uma, nem outra daquelas
“receitas” é a correcta, sob o ponto de
vista da eficácia.
Mas se tivesse que
optar por uma delas não hesitaria em
prescrever a primeira, isto é, a do diálogo
– esta civilizada e sensata via de
solucionar diferendos, a que, infelizmente,
tão pouco se recorre.
A meu ver, o único
meio eficaz de resolver um problema – a
guerra e o terrorismo (a guerra gera-o
sempre) podem ser, e em regra são, um dos
maiores problemas, senão o maior, que ao ser
humano se pode deparar, na medida em que
causam a morte e a destruição e são inimigos
da paz – o único meio eficaz de resolver um
problema, dizia, é combater e eliminar a sua
causa. Por isso, a primeira coisa a fazer é
descobri-la.
Na minha opinião,
a causa única do terrorismo, com que a
Humanidade tem vindo sistematicamente a
confrontar-se, é a violência e a
desumanidade da injustiça, assente na
arrogância, na mentira e no desprezo
absoluto pelos direitos humanos – a única
causa do terrorismo é, afinal, precisamente
o terrorismo.
Aqui chegados,
importa definir, desde já, o que é
terrorismo. Qualquer dicionário o definirá
como sendo todo o acto violento que causa ou
provoca terror. E se esta definição está
correcta – como definitivamente e sem
imodéstia considero que está – terrorista é
todo aquele que pratica tal tipo de actos,
independentemente da motivação e da
qualidade em que o faz, da raça a que
pertence e do credo que professa: não há
terrorismo bom e terrorismo mau; não há
terrorismo melhor e terrorismo pior; ou há
terrorismo, ou não há. E o terrorismo é
péssimo.
No que concedo é
que ele possa manifestar-se de modos
diferentes: embargo económico e sanitário a
um país, acarretando a fome e a doença dos
seus habitantes, e vezes tantas a morte,
designadamente de crianças, idosos e
doentes, como vezes demais, um pouco por
todo o mundo, tem acontecido, é terrorismo?
Não tenho dificuldade em aceitar que é, no
mínimo, um modo de o provocar; invadindo
países soberanos, com todo o cortejo de
mortos, estropiados e destruição, mesmo
quando antes não tenha existido qualquer
acto bélico hostil desses países para com o
invasor, é terrorismo? Sem dúvida que é;
testar armamento bélico, ainda por cima o
mais horrendo e mortífero, como é a bomba
atómica, lançando, sem aviso prévio, duas
delas, como fizeram os Estados Unidos sobre
as cidades japonesas de Hiroshima e
Nagasaki, em que foram bárbara e
indiscriminadamente chacinadas, sem dó, nem
piedade, ali, 300 mil pessoas, aqui, 200
mil, é terrorismo? Quem pode duvidar?
Já agora que
diferença qualificativa existe entre aquele
acto e o do 11 de Setembro? Qual deles pode
fazer esquecer o outro? Quem é mais
terrorista, Ossama Bin Laden ou o monstro
que ordenou o lançamento daquelas bombas?
E se todo o efeito
tem uma causa, porque terão surgido (entre
outros) o terrorista Bin Laden e os
terroristas suicidas palestinos? A esta
questão, sobre que a Humanidade se
interroga, ainda não ouvi nenhum governante
americano ou qualquer dos seus acólitos
responder, com sensatez! Seria, sem dúvida,
interessante que o fizessem. Mas sem
hipocrisia. É claro que nunca o farão…
Que reacção se pode
esperar de povos sobre quem,
sistematicamente, se provoca o terror?
Alguém duvida de que
terror gera terror?
Alguém,
minimamente informado e de bom senso, pode
duvidar de que, contrariamente ao que certos
políticos ocidentais disparatadamente estão
a pretender fazer passar, o que, nesta
matéria, temos vindo a assistir na cena
internacional não é a uma guerra entre
religiões, mas antes ao confronto entre, por
um lado, uma política internacional de
domínio, pela humilhação e pelo terror,
protagonizada pela única superpotência e por
alguns países seus acólitos, sobretudo
Israel, e, por outro lado, uma natural
reacção dos povos oprimidos e humilhados por
essa política?
É por tudo isto
patética ilusão admitir-se que existem
medidas que previnem o terrorismo,
mantendo-se aquela política de agressões.
Tenho, pois, como
certo que o terrorismo – interno ou
internacional – só se combate com o respeito
pelo direito. O terrorismo jamais será
aniquilado pela guerra, porque antes com ela
é estimulado.
Se não, como
explicar, por exemplo, que, tendo o motivo
(oficial) para a invasão do Afeganistão sido
o combate ao terrorismo internacional
(aforismo invariavelmente utilizado para
justificar qualquer acção de violação do
direito internacional) e a eliminação de Bin
Laden, aquele se tenha fortalecido e
continuado activo, mesmo após a eliminação
deste, ocorrida muitos anos depois daquela
invasão?
E como explicar
que um dos motivos (também oficiais) para a
invasão do Iraque tivesse sido o combate ao
mesmíssimo terrorismo e, desde então, este
país tenha passado a viver a ferro e fogo,
sobretudo durante vários anos após aquele
acto bélico, assente, como logo se viu, numa
ignominiosa mentira?
Como pode alguém
continuar a defender a guerra!…
António Grosso
Correia
- n.13 • junho 2020