Paulo Cunha

Musique-se

Paulo Cunha

Música Tik Tok

Todos os anos em que recebo na escola onde ensino alunos que iniciam um novo ciclo de escolaridade, solicito-lhes que preencham uma ficha informativa onde constam as suas preferências musicais quanto aos tipos/géneros de música e intérpretes/grupos musicais. Naturalmente, ano após ano, as respostas vão variando consoante as predileções e as músicas que estão então na moda. Nada que me surpreenda!

Ora, uma das vantagens de ser professor de Educação Musical é poder estar constantemente a “medir o pulso” às novas tendências musicais que as novas gerações vão abraçando e tomando como suas. Tenho vindo a descobrir que, cada vez mais, os alunos não conhecem intérpretes nem géneros musicais. Hoje, numa turma de 5.º ano de escolaridade, ao perguntar que música ouviam os seus pais, grande parte dos alunos respondeu que não sabe ou que os seus pais não escutam música (o que duvido). Responderam-me também, maioritariamente, que usam apenas o telemóvel como fonte sonora.

Ao responderem “Eu ovo determinada música”, percebo que muitos jovens nunca conjugaram o verbo ouvir, pois jamais alguém lhes terá perguntado o que eu questiono. Confesso que me tenho surpreendido com as respostas redutoras com que alguns jovens, entre os dez e os doze anos, me respondem: “A minha música preferida é da Rádio Comercial!” ou, mais atualmente, “Só oiço e conheço as músicas que dão no Tik Tok”.

Ao comentar e perguntar aos meus alunos se têm a noção que ao ouvirem a música duma determinada estação de rádio, de tv ou de uma rede social estão a deixar que sejam os outros a escolher e a condicionar o seu gosto musical, muitos deles, sem sequer responder, só pela expressão facial denotam que nunca terão refletido ou pensado em tal questão. Por analogia, de seguida, questiono se lhes perguntar qual é a comida que mais apreciam irão responder que é a de um determinado restaurante. Obviamente, respondem-me que não, pois num restaurante existem muitos pratos na lista e eles só escolhem o que mais gostam. Naturalmente, percebem onde quero chegar com a questão.

Pois… tal como noutras áreas, desde tenra idade temos já influencers atentos às escolhas dos jovens potenciais consumidores. Prontos a condicionar e a decidir as preferências daqueles que, pela ausência de conhecimento, depositam nos outros o seu gosto e, por consequência, muitos “gostos”. Sabendo que assim é, as multinacionais ligadas à produção musical não olham a esforços e meios para usar as redes sociais, youtube e rádios privadas para manietar, condicionar e assim estandardizar o gosto por determinados músicos que, a prazo, servirão os interesses das mesmas.

Para além do pouco que aprendem nas aulas de Educação Musical, é vital que a família desempenhe o importante e insubstituível papel na formação musical das novas gerações, sob pena de, a curto prazo, enfermarmos de iliteracia musical. Porque tal como noutras áreas da cultura, nada é pior do que imaginar que os vindouros serão desprovidos dos conhecimentos que lhes permitirão ter sentido crítico, analítico e estético, inviabilizando-lhes assim a capacidade de formular opiniões sustentadas e justificadas sobre o que musicalmente produzirão e consumirão.