Musique-se
Paulo Cunha
A música salva!
- Partilhar 01/11/2021
Tornou-se
quase um lugar-comum ouvir e ler que a
música salva. São cada vez mais os
relatos partilhados pelos consumidores
de música, referindo a importância da
música nas suas vidas. E o que dizer da
quantidade de músicos que referem o
papel salvador da música? Desde David
Byrne, passando por Milton Nascimento e
acabando em James Hetfield (Metallica),
são imensos os relatos dos seus
obreiros, afirmando qua a música os
salvou.
No seu livro “Apologia, A
República, Livro III”, Platão referia
que “A formação musical é um instrumento
mais potente do que qualquer outro,
porque o ritmo e a harmonia encontram o
caminho para dentro da alma, em que
poderosamente se prendem, dando graça e
tornando graciosa a alma daquele que é
corretamente educado.”
A música
está tão presente nas nossas vidas que
talvez seja difícil imaginar como seria
o mundo se ela não existisse. Para além
dos concertos, audições e saraus, existe
música em quase todos os momentos de
convívio social (igrejas, bares, ruas,
shoppings, feiras, reuniões familiares,
etc.), bem como no isolamento do lar, do
carro e de outras situações quotidianas.
A ideia de que a música afeta a
saúde e o bem-estar das pessoas foi
defendida por Aristóteles e Platão.
Somente na segunda metade do século XX,
alguns médicos conseguiram estabelecer
uma relação entre a música e a
recuperação dos seus pacientes, tendo,
no final da Segunda Guerra Mundial, sido
chamados músicos para tocar em
hospitais, como forma de auxiliar o
tratamento dos feridos. Como a
experiência surtiu resultados positivos,
as autoridades médicas dos Estados
Unidos da América decidiram habilitar
profissionais para utilizar criteriosa e
cientificamente a música como terapia. O
primeiro curso de musicoterapia foi
criado em 1944, na Universidade Estadual
de Michigan.
Segundo um artigo
publicado no jornal “Critical Care
Medicine”, parece existir uma resposta
fisiológica efetiva à música por parte
de enfermos intervencionados
cirurgicamente. Ouvir Mozart surtiu
maior efeito sedativo do que alguns
fármacos. Verificou-se uma diminuição da
pressão sanguínea e dos batimentos
cardíacos, a par de uma menor
necessidade de recorrer a analgésicos e
de uma descida dos níveis de algumas
hormonas relacionadas com o stress.
O efeito terapêutico da música,
porém, vai muito além do aspeto
tranquilizante duma sonata de Bach ou
duma sinfonia de Beethoven. Estudos
garantem que a música potencializa a
reabilitação de pacientes em casos de
doenças degenerativas do cérebro, como
Parkinson e Alzheimer, melhora a
coordenação motora de deficientes
físicos e induz a liberação de certas
substâncias, como a dopamina e a
serotonina, que proporcionam sensação de
prazer e bem-estar.
Quem não se
emocionou já ouvindo uma certa música?
Ou se lembrou de alguém especial ao
cantarolar algumas notas? Os sons marcam
momentos, trazem memórias e podem
deixar-nos tristes, alegres, irritados
ou alerta. É o que nos mostra a
musicoterapia, ao procurar potenciar e
restaurar a saúde do indivíduo através
da prevenção, tratamento e reabilitação.
Desde um consultório repleto de
temas musicais, onde o paciente expressa
os seus sentimentos, até uma cama de
hospital, independentemente do "palco",
a musicoterapia consiste na qualificada,
programada e devida utilização dos
elementos e qualidades musicais. Além
dos objetivos terapêuticos pretendidos,
os processos usados facilitam a
comunicação, o relacionamento e a
aprendizagem, atingindo assim as áreas
mentais, físicas, sociais e cognitivas.
A prática musical potencia o
desenvolvimento cognitivo, a atenção, a
memória, a agilidade motora, assim como
cria uma experiência unificadora entre a
linguagem, a música e o movimento.
Pitágoras dava à terapia pela música o
nome de purificação. A sua música
curativa propunha-se a equilibrar as
quatro funções básicas do ser humano:
“Pensar, sentir, perceber e intuir”.
A música serve de terapia para todas
as idades. Contribui para o bem-estar
geral do organismo e para a saúde plena
do indivíduo. A Organização Mundial da
Saúde (OMS) formulou em 1946 a seguinte
definição de saúde: “A saúde é um estado
de total bem-estar físico, psíquico e
social e não apenas a ausência de
doenças ou debilidade. Dispor da melhor
saúde possível é um direito de todo o
homem, independentemente da raça,
religião, convicção política ou situação
económica e social”. É esse também um
dos papéis da música: fazer aumentar a
autoestima, a memória, a coordenação
motora e a integração do indivíduo na
sociedade, colaborando assim para uma
formação e informação organizada,
harmoniosa e saudável.
Ouvir
música é saudável para toda a gente.
Alivia tensões, ajuda a refletir,
transporta-nos para cenários de prazer,
cura-nos. Cantar pode até não espantar
os males, como apregoa a sabedoria
popular, mas a utilização de sons,
ritmos, melodias e harmonias ajuda a
restabelecer a saúde de alguns
pacientes. É o que garantem médicos das
mais diferentes especialidades, que
utilizam a musicoterapia como recurso
terapêutico no tratamento
multidisciplinar de inúmeras doenças.
Assim sendo, do que é que estão à
espera? Ouçam e/ou façam música!
- n.30 • novembro 2021