ajustado ao funil
Luís Horta
Computadores e smartphones versus cadernos e livros
- Partilhar 16/12/2021
Quando o
grande desafio do professor moderno é
controlar o uso de smartphones dentro da
sala de aula, uma questão impõe-se: se os
alunos estão constantemente ligados à
Internet a usar aplicativos que os distraem,
porque não virar o feitiço contra o
feiticeiro e implementar o uso de
computadores e telemóveis como ferramentas
de estudo? Porque não usar as novas
tecnologias em substituição dos cadernos e
livros escolares convencionais ou, pelo
menos, dar aos alunos liberdade de escolha?
Bem sei que são questões
controversas. Por um lado, o computador dá
acesso a conteúdos de qualidade, atualizados
em tempo real, mas por outro lado, também dá
acesso a conteúdo pobres que só distraem o
aluno durante a aula. No entanto, a ideia de
conciliar as duas ferramentas de estudo,
implementada por alguns professores, parece
funcionar bem como recurso pedagógico:
imagens, vídeos e programas
interativos atraem a atenção dos alunos e
motivam-nos a aprender. Softwares e
aplicativos permitem que os professores
façam uma avaliação quase instantânea. Mas a
questão mantém-se: deverão os alunos trocar
o caderno e o manual pelo computador?
O
assunto divide opiniões. Alguns pais, alunos
e professores são a favor da mudança, outros
contra e outros ainda, por via das dúvidas,
defendem a complementaridade de recursos.
Quem ganhará o debate? O tempo o dirá. Mas,
entretanto, nada nos impede de explorar
alguns tópicos sobre o uso da tecnologia em
sala de aula.
Boa relação
custo-benefício?
É verdade que os
equipamentos eletrónicos são mais caros que
os livros, mas também é verdade que os
alunos (atrevo-me a dizer todos os alunos do
ensino secundário e universitário) já têm
smartphone e computador. Por isso, a relação
custo-benefício pode ser satisfatória, se
considerarmos o facto de que os pais compram
esses dispositivos aos filhos para outras
finalidades e independentemente da despesa
anual com material escolar (com cadernos e
livros de atividades e retirando da equação
os manuais adotados que são grátis até ao
12º ano). Porém, como não considerar os
alunos mais desfavorecidos que recentemente
foram alvo de atenção por não terem
equipamentos ou rede de acesso à Internet,
para acompanharem às aulas online durante os
sucessivos confinamentos?
Inclusão de diferentes tipos de alunos?
Muito se defende a tecnologia como fator
de inclusão, já que é possível utilizá-la na
sala de aula (online e offline) para incluir
todo o tipo de alunos com necessidades
especiais. Mas isso remete-nos de novo ao
tópico anterior: e os alunos mais
desfavorecidos? Teriam apoios atempados por
parte do Estado? Enquanto aguardamos pela
resposta, continuamos a viver num mundo de
diferenças sociais, com uma separação de
classes que determina quem são os alunos que
podem ter acesso a equipamentos mais caros.
Peso a menos na mochila?
Se
alunos e encarregados de educação se
queixam-se amiúde do peso das mochilas,
porque é que este argumento não tem força na
discussão sobre o uso da tecnologia na sala
de aula? A adoção de livros digitais, aos
quais os jovens podem aceder rápida e
facilmente pelo smartphone, tablet ou PC,
reduzia a carga (superior à recomendada
pelos médicos) que trazem às costas, com
cadernos, manuais, livros de atividades,
estojos…
Aulas mais interessantes
e dinâmicas?
Será que o dinamismo e
interesse de uma aula depende única e
exclusivamente do professor e do perfil dos
alunos? Ou será que também depende dos
recursos de ensino? Efetivamente, como estão
habituados a usar dispositivos tecnológicos,
os alunos podem sentir-se mais desmotivados
em aulas expositivas com recurso exclusivo a
livros impressos. Mas será que o entusiasmo
em usar o smartphone e computador na sala de
aula seria sinónimo de atenção e resultaria
numa melhoria dos resultados escolares?
Prevenção de problemas oculares?
Dentro da corrente contrária à
utilização de computadores na sala de aula,
ouve-se de tudo, inclusive que o computador
faz mal à vista. Será verdade? Ou o
computador em si não prejudica a visão das
crianças e jovens e é a exposição prolongada
a ecrãs que pode ter efeitos negativos? A
maioria dos aparelhos eletrónicos emite uma
luz azul, sim, mas só pode ser prejudicial
para a saúde ocular se não existirem filtros
protetores.
Maior conforto e
comodidade?
Pais e professores podem
não estar de acordo, mas a verdade é que os
alunos são unanimes: sentem-se bastante
confortáveis a ler através de ecrãs e não
dão sinais de cansaço, ao contrário de
pessoas mais velhas que preferem livros
impressos, mesmo existindo e-books que
simulam o papel branco dos livros e a
diagramação dos textos.
Mais
opções de escolha?
Se procurarmos na
Internet, o que não faltam são e-books e
áudio-books, mas quanto a manuais escolares
digitais, pode haver alguma dificuldade em
encontrá-los. Logo à partida porque as
editoras (por questões económicas) não os
disponibilizam em versão digital, mas
existem outros motivos que fazem com que
ainda seja mais fácil encontrar um manual
escolar em papel. Ainda…
O manual
convencional traz resultados mais eficazes?
Alguns estudos indicam que os métodos
tradicionais, como a utilização do caderno e
manual escolar, são mais eficientes. Por
exemplo, Pam A. Mueller e Daniel M.
Oppenheimer, pesquisadores das universidades
de Princeton e da Califórnia,
respetivamente, fizeram um estudo intitulado
“The Pen Is Mightier Than the Keyboard:
Advantages of Longhand Over Laptop Note
Taking”. Nesse estudo, publicado pela
primeira vez em 2014, chegaram à conclusão
de que os alunos que tiravam apontamentos no
computador conseguiam transcrever quase todo
o conteúdo da aula, enquanto que os alunos
que tiravam apontamentos à mão, para o
caderno, só escreviam os excertos mais
relevantes. Porém, eram os segundos que
tiravam melhores notas! Porquê? O uso dos
computadores prejudica a memória? Tirar
apontamentos à mão favorece a atenção? A
verdade é esta: o mais importante não é o
meio usado para tirar apontamentos, mas sim
a atenção prestada e a forma como se tiram
os apontamentos em sala de aula!
Os computadores podem substituir os cadernos
e os manuais escolares?
Poder podem,
mas o ideal é que se complementem. Já dizia
Bill Gates, fundador da Microsoft, a
respeito da questão “computadores ou
livros”, que os primeiros não substituem os
segundos: “É claro que os meus filhos terão
computadores, mas antes terão livros”. Os
livros em geral e os manuais e cadernos
escolares, em particular, continuam a
potenciar a aprendizagem. O seu uso continua
a ser didático e eficaz, mas as novas
tecnologias também têm e terão cada vez
mais, um papel dinâmico na aprendizagem.
- n.31 • dezembro 2021