reflexões in verso
Afonso Dias
das guerras
- Partilhar 11/04/2022
das guerras
a
mulher abusada no ventre de tudo
é um novelo de luto
que me envolve
na notícia diária
estupro alarve;
uma criança a florir
morte no sorriso
é bênção nula do
natal que vem avesso
escárnio da
natureza retorcida e ferro
sobre a
pureza da neve em flor inerte
ecuménica a dor de verbo e a prece
diversas como a indiferença tanta
e a
maldade cinzenta tão fervente
que
deus nem imagina a geografia
que a
rosa dos ventos não acolhe
plena que
é de norte e sul e este e oeste
ó
maldade maior és cega e surda
e não
lambes do vento todo as lágrimas
de
sangue e sal das latitudes doidas
a dor viva iemenita e palestina
ou tibetana ou síria ou afegã
e
ucraniana sede justos
pese o diverso
carimbo dos ferretes
é igual na
mulher mágoa chaga inteira
tão grande
é e sem caução do poder cego
que tudo
pode em todo lado e é sempre igual
indiferente é o sotaque e a gravata
barbaridade é o que barbariza
e
nada floresce sobre o entulho
de
betão de música e de ossos
fazer mal
é maldade sempre ouvi
pecadora maior
a indiferença
e o poder de deus (dos
deuses) feneceu
pela areia pela
lama pela neve
leva a mulher os
filhos e a vida
poesia do útero e
vital encargo
não dar a outra
face é dignidade
(as lágrimas
daquele homem que dor tanta)
vergonha
é ser capaz de não chorar
- n.35 • abril 2022