Afonso Dias

reflexões in verso

Afonso Dias

das guerras

das guerras

a mulher abusada no ventre de tudo
é um novelo de luto que me envolve
na notícia diária estupro alarve;
uma criança a florir morte no sorriso
é bênção nula do natal que vem avesso
escárnio da natureza retorcida e ferro
sobre a pureza da neve em flor inerte

ecuménica a dor de verbo e a prece
diversas como a indiferença tanta
e a maldade cinzenta tão fervente
que deus nem imagina a geografia
que a rosa dos ventos não acolhe
plena que é de norte e sul e este e oeste

ó maldade maior és cega e surda
e não lambes do vento todo as lágrimas
de sangue e sal das latitudes doidas

a dor viva iemenita e palestina
ou tibetana ou síria ou afegã
e ucraniana sede justos
pese o diverso carimbo dos ferretes
é igual na mulher mágoa chaga inteira
tão grande é e sem caução do poder cego
que tudo pode em todo lado e é sempre igual
indiferente é o sotaque e a gravata

barbaridade é o que barbariza
e nada floresce sobre o entulho
de betão de música e de ossos
fazer mal é maldade sempre ouvi
pecadora maior a indiferença
e o poder de deus (dos deuses) feneceu

pela areia pela lama pela neve
leva a mulher os filhos e a vida
poesia do útero e vital encargo

não dar a outra face é dignidade

(as lágrimas daquele homem que dor tanta)
vergonha é ser capaz de não chorar